De Olho na Mídia

Denunciar e punir: em nome das mulheres vítimas de violência

Nathália Perdomo

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Durante a campanha dos 16 dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as mulheres, diversos eventos acontecem no Brasil e no mundo a fim de elucidar, conscientizar e levar ajuda às vítimas da violência doméstica e sexual.

Uma pesquisa feita pela Fundação Perseu Abramo mostra que a cada 15 segundos uma mulher é espancada no Brasil. Isso resulta em um mínimo de 2,1 milhões de mulheres agredidas por ano no país. Dentre elas, mais da metade não pede qualquer tipo de ajuda.

A mídia poderia fazer parte da rede de serviços de apoio à mulher, dando visibilidade aos casos e divulgando os resultados. No entanto, os jornais e as emissoras de televisão nem sempre acatam o tema com responsabilidade e seriedade.

Ludmila Cavalcanti, professora da Escola de Serviço Social (ESS/UFRJ) e Conselheira do Conselho Estadual de Direitos da Mulher do estado do Rio de Janeiro (CEDIM-RJ) vem participando de seminários e outros eventos que possibilitam a disseminação da campanha e da força da lei em favor da mulher. A professora discute a cobertura da mídia e reflete acerca de um tema que não quer calar

“Há pouco tempo orientei uma monografia sobre violência perpetrada pelo parceiro íntimo e mídia. O que se observa é um aumento da cobertura da mídia nos últimos anos, certamente, resultado do esforço do Movimento Organizado de Mulheres. Há também uma preocupação dos próprios jornalistas em trazer discussões importantes com conteúdo educativo e informativo acerca da violência contra a mulher. O tema ganhou visibilidade, mas o modo como é pautado ainda apresenta uma série de estereótipos de gêneros, arraigados no senso comum. Quando uma mulher sofre agressão, as pessoas a julgam pela roupa que vestia, pelo local em que estava e pelo horário… Isso acaba sugerindo certa culpabilização do comportamento feminino, especialmente quando a matéria trata da violência sexual.”

Ludmila ressalta ainda que são notáveis as políticas locais, que estabelecem uma espécie de censura da informação.

“Em Pernambuco, por exemplo, há uma grande quantidade de casos de violência contra a mulher. Na região Norte, onde há forte exploração de menores, a mídia local pauta pouco esse tema. Afinal, de quem são os jornais, as revistas? Tem uma política local que acaba sonegando a informação, fazendo com que haja uma distribuição desigual nos jornais. A partir dessa análise observamos que há uma concentração da informação no Rio e em São Paulo. O conteúdo das matérias produzidas nos grandes centros tem uma linguagem mais adequada, com capacidade informativa, crítica e analítica, trazendo instituições e políticas públicas que atendem a essas mulheres”, critica.

Lei Maria da Penha

Promulgada pelo presidente Lula em 2006, a Lei Maria da Penha é uma conquista das mulheres brasileiras que, até então, careciam de uma lei específica que as amparasse juridicamente contra a violência doméstica e sexual. Com a criação da lei, o agressor já pode ser preso em flagrante ou ter a prisão preventiva decretada. Além disso, a violência psicológica passa a ser caracterizada como crime.

“O estado reconhece, através do Legislativo e do Executivo que a mulher precisa ser protegida e que a lei, de fato, responsabiliza quem perpetra a violência contra a mulher. Essa lei obriga materializar uma série de políticas públicas, apresenta as definições sobre a violência, elucida o caráter preventivo, se preocupa com o trabalho educativo e terapêutico do agressor, aproxima esferas do judiciário, além de articular políticas de saúde e educação. Foram extintas as penas em que o réu é condenado a pagar cestas básicas ou a fazer trabalhos comunitários. Hoje, o crime contra a mulher é realmente punido. Está entre os crimes hediondos. Apesar da resistência de alguns operadores do direito em aplicar a lei, o número de denúncias aumentou e as mulheres não estão com medo de delatar”, avalia a professora.

Mulheres apaixonadas

O assunto é polêmico e já conquistou espaço nas telenovelas brasileiras. Em 2003, ano em que foi realizada a primeira campanha dos 16 dias no Brasil, Mulheres apaixonadas mostrou Raquel (Helena Ranaldi) sendo agredida com uma raquete pelo ex-marido, Marcos (Dan Stulbach), tratado como doente mental na trama.

O drama da personagem, a audiência e a mobilização do público agilizaram a tramitação de propostas, visando aumentar a pena para os agressores. Depois do episódio em que, ao superar o medo, Raquel denuncia o marido, o número de vítimas reportando agressões sofridas na delegacia de atendimento à mulher aumentou de forma significativa.

“Ainda que a Rede Globo tenha pautado o tema na novela Mulheres apaixonadas, visitado o Centro Estadual dos Direitos da Mulher (Cedim) e transmitido a mensagem no horário nobre, causando grande repercussão, o agressor na trama era patologizado, como se fosse um doente mental, com distúrbio de comportamento, desvio de conduta. Isso cria um estereótipo, levando a sociedade a pensar que os homens agressores são loucos. Quando está provado pelos estudos da Segurança Pública e pelo relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) de 2002 que os maiores agressores são conhecidos das mulheres: maridos, ex-namorados, principalmente. Além disso, no desfecho da novela, a vítima conseguiu superar o trauma, mas o agressor continuou impune. Ele sofreu um acidente e explodiu dentro do carro, o que parece bastante ficcional. Acredito que o desfecho deve ser verdadeiro e positivo, para estimular as mulheres a denunciar”, conclui.

Buscar ajuda

Diversos serviços especializados estão à disposição das mulheres que sofrem algum tipo de violência e buscam ajuda. Dentre eles, podem-se destacar os “Centros de Referência de Atendimento às Mulheres em Situação de Violência”, responsáveis por fazer um primeiro atendimento e o encaminhamento das vítimas para outros núcleos de assistência de sua rede.

Veja a rede de serviços especializados de atendimento à mulher.

CIAM – Centro Integrado de Atendimento à Mulher. Rua Regente Feijó, 15. Praça Tiradentes – Rio de Janeiro. Telefones (21) 2299-2122 e 2299-2125. Horário das 9h às 18h, de segunda a sexta-feira.

DEAM – Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher. Av. Amaral Peixoto, 577. Centro – Niterói. Telefones (21) 3399-3700, 3701-3798 e 3703-3798.

Defensoria Pública. Edifício das Secretarias – Rua Visconde de Sepetiba, 519, 6º andar. Centro – Niterói.

OAB-Mulher. Av. Amaral Peixoto, 507, 10º andar. Centro – Niterói. Telefone (21)2710-8470, ramal 218.

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