De Olho na Mídia

Que policial é esse?

Rodrigo Lois – AgN/ Praia Vermelha

imagem ponto de vista

Duas mortes de inocentes em menos de 10 dias. Esse é o saldo recente das ações da polícia militar do Rio de Janeiro em perseguições a bandidos. João Roberto, um menino de 3 anos, foi baleado, no último dia 6, porque os policiais não perceberam que o carro no qual atiravam era de uma família, não o dos criminosos. O outro caso, ocorrido no dia 14, envolveu Luiz Carlos Soares da Costa, um administrador de empresas de 36 anos, que acabou sendo ferido enquanto era mantido como refém dentro do próprio automóvel. Além disso, mesmo combalido, foi retirado pelos policiais de dentro do veículo de forma brusca, o que contribuiu para sua morte. Seriam essas pessoas mais duas vítimas do despreparo da polícia carioca? Ou a população não deve conceituar a corporação como propõe a mídia e considerar os acontecimentos casos de erros individuais? Aliás, existem interesses midiáticos na cobertura policial?

Os episódios citados recebem grande destaque na mídia e convivem com a pouca atenção dada pelos meios de Comunicação aos casos em que a polícia se comporta de maneira correta, com competência. Esse quadro faz com que a Força Pública seja “demonizada” e que alguns erros sejam generalizados.

Segundo Marcos Bretas, professor de História do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS) e especialista na relação da polícia com a sociedade, a imprensa, de fato, não noticia as boas ações policiais. “Isso faz parte de sua configuração. O papel da imprensa é divulgar publicamente o que está errado para que possamos melhorar”, esclarece o professor.

A população, baseada no que aparece na mídia, acaba, muitas vezes, fazendo um julgamento distorcido da polícia, conceituando todos os seus integrantes como desonestos e violentos. Mas a realidade contempla também policiais honestos e de boa índole. Para Marcos Bretas, talvez esse seja o maior desafio: “como lidar com policiais que, com as melhores intenções, cometem erros dramáticos, estimulados pelas políticas públicas?”.

As ações violentas em destaque são, muitas vezes, conseqüências da postura policial adotada atualmente baseada na “política do enfrentamento”. De acordo com o professor, “trata-se de uma política de enfrentamento armado. Enfrentar é tarefa policial indiscutível. O que vemos hoje é uma opção por ações que provocam confrontos onde há troca de tiros, resultando vítimas dos dois lados e também entre a população apanhada no meio do tiroteio”. Além disso, Bretas acredita que “a polícia do Rio é mal preparada para atirar, mas, ao mesmo tempo, levada a crer que é assim que se resolvem problemas”.

Falhas da mídia

Certos episódios que denotam a ética e o comprometimento dos bons policiais são, muitas vezes, ignorados pela grande imprensa. Um exemplo disso foi que, poucos dias após a morte do menino João Roberto, um grupo de policiais na cidade do Rio de Janeiro encontrou cerca de 20 mil reais e devolveu todo o dinheiro ao dono. Apenas uma nota sobre esse episódio foi publicada nos grandes jornais. Até na Internet foi difícil encontrar algo sobre o acontecimento.

Para Bretas, esse comportamento pode estar relacionado com a cultura do medo: “A imprensa é sem dúvidas a grande produtora dessa cultura". Esse bombardeio de notícias chocantes direcionado à população tem propósitos, como criar uma situação de medo constante e desestabilizar figuras políticas do Estado. O professor defende que “é muito importante que os profissionais da imprensa discutam suas responsabilidades e revejam o seu papel na sociedade”.

Como ressaltou Marcos Bretas, a Polícia do Rio de Janeiro realmente possui deficiências: “Faltam recursos, investimento na qualificação do policial, na sua legitimação enquanto agente do poder público, no seu treinamento e tantas outras coisas”. Porém, ainda segundo ele, a sociedade não deve creditar aos oficiais a mesma precariedade do sistema em que trabalham, caracterizar tudo e todos como ruins, como muitas vezes acabamos fazendo baseados no que é exposto na mídia: “O problema está quando achamos que tudo está errado”, afirma o professor.