Entrelinhas

200 anos de História dos Seguros no Brasil

Cinthia Pascueto – AgN/Praia Vermelha

capa do livro

Comemoramos agora os 200 anos da chegada da Corte Portuguesa ao Brasil. Como se sabe, a vinda da Família Real trouxe diversas inovações e mudanças estruturais para a então colônia portuguesa, como a criação dos cursos de medicina na Bahia e no Rio de Janeiro e a ascensão do Brasil a Reino Unido de Portugal e Algarves. No plano econômico não foi diferente: ainda em 1808, D. João VI, príncipe regente, assina decretos em sua passagem por Salvador, autorizando a fundação de companhias de seguros e a criação de uma Provedoria de Seguros na cidade. Esse é um dos temas do livro A história dos seguros no Brasil, organizado por Alexis Cavicchini, professor adjunto da Faculdade de Administração e Ciência Contábeis (FACC) da UFRJ.

O livro, lançado no dia 1º de outubro, conta também com a participação de diversos nomes do jornalismo e da economia, como Jorge Clapp, assessor de Comunicação Social da Federação Nacional dos Corretores de Seguros (Fenacor), Denise Bueno, jornalista da Gazeta Mercantil, Paulo Amador, jornalista, advogado, procurador federal aposentado e ouvidor da Seguradora Líder dos Consórcios do Seguro DPVAT; Ubiratan Solino, assessor de imprensa da MPM Propaganda, sócio diretor da revista Banco Hoje, chefe de reportagem e editor do Jornal do Commercio; e Fernando Mello, economista formado pela UFRJ e organizador do livro Cenários para a economia brasileira.

Para contar sobre a composição da obra e sua importância no ano que os seguros completam o bicentenário no Brasil, o Olhar Virtual conversou com Alexis Cavicchini, sobre alguns aspectos de relevância abordados em A história dos seguros no Brasil.

Olhar Virtual: Em primeiro lugar, como surgiu a idéia de escrever um livro sobre seguros?

A idéia surgiu nas pesquisas para um livro que fizemos em 2007, A história dos bancos no Brasil. Quando comecei a fazer estas primeiras pesquisas, percebi que os seguros começavam a ter uma participação cada vez maior nos resultados dos bancos. As seguradoras cresciam numa velocidade tal que, em pouco tempo, seriam partes expressivas de todos os conglomerados financeiros do país.

Outro motivo é a carência de material sobre a história do mercado financeiro no Brasil, extremamente rico em criatividade. É impressionante a inovação em produtos e na organização do trabalho no setor financeiro.

Olhar Virtual: De que forma o livro é estruturado?

O livro faz uma abordagem histórica, englobando todas as variedades de seguro, desde os primeiros registros – no Código de Hamurabi, na Babilônia de 1700 a.C, sobre empréstimos às caravanas. Essa história anterior ao Brasil é aventada para que as pessoas tenham um relato amplo, saibam como foi que isso começou.

Olhar Virtual: O senhor poderia contar rapidamente como esse início dos seguros, desde o Código de Hamurabi, desenvolveu-se até chegar ao Brasil?

Depois do Código, os gregos desenvolveram alguns princípios sobre cargas marítimas, como as avarias navais, procedimento similar ao atual. Temos uma passagem sobre a influência dos venezianos, sobretudo mostrando a diferença nos negócios com seguros em relação à Gênova. Na seqüência, a expansão Ibérica, a vinda da família real portuguesa para a colônia e, finalmente, os seguros no Brasil. A ênfase do livro começa a partir daí, mas é importante mostrar que A história dos seguros no Brasil não surgiu do nada. Se começássemos apenas nesse momento, deixaríamos as pessoas curiosas sobre o que aconteceu antes.

Olhar Virtual: Qual importância o senhor atribui aos seguros?

É importante que as pessoas tenham um conhecimento melhor sobre os seguros e entendam como funciona essa indústria, seus aspectos fascinantes. Algumas curiosidades me surpreenderam muito durante a pesquisa, como: por que a América tem esse nome, se talvez o mais correto fosse fazer essa homenagem a Colombo? Eu tive a oportunidade de constatar a razão.

Olhar Virtual: Por que ocorreu?

Porque Américo Vespúcio era um grande segurador banqueiro, representante e amigo da família Médici que não só financiou como também segurou as expedições marítimas espanholas. Ele desenvolveu um trabalho fantástico de incentivo ao comércio marítimo espanhol, recebendo assim as homenagens, inclusive muito justas. O livro conta sobre o trabalho de Vespúcio na casa de contratação e o que ele fez pela expansão marítima espanhola.

Olhar Virtual: A história dos seguros no Brasil completa também seu bicentenário, do mesmo modo que a vinda da Família Real. Qual a relação entre os dois eventos?

Acredito que quando D. João VI chegou a Salvador ele já sabia o que procurar. Na época, o grande capital no país era escravista. Na época, ainda não existia seguro de vida, mas os escravos poderiam ser segurados como cargas. A quantidade de dinheiro que movimentavam era impressionante. Os seguros feitos aqui, entretanto, não eram registrados na Casa de Contratação de Lisboa. D. João VI, segundo minhas conclusões – não existe nenhum documento histórico que comprove essa suposição –, provavelmente desembarcou em Salvador para conversar com os grandes capitalistas da época, em situação irregular, e que, se recebessem a permissão do reino para fazer seus negócios aqui, tendo-se uma Casa de Contratação no Brasil, poderiam regularizar sua situação com a Coroa. Forneceriam subsídios para que ela pudesse se instalar aqui na Colônia.

Esse poderia ter sido um negócio tão grande que permitiria o estabelecimento da Corte Portuguesa. A meu ver, então, a razão de D. João VI ter aportado em Salvador, e não em Recife, mais próxima, foi porque ele sabia com quem conversar. Ele precisava de dinheiro e conversou com as pessoas mais ricas da Colônia para conseguir apoio na chegada ao Brasil.

Olhar Virtual: De que forma funcionavam esses seguros de escravos?

Quando havia um grande seguro a fazer, por exemplo, de escravos vindos da África, preparava-se uma lista. Cada segurador assinava e dizia “eu assumo tantos por cento de risco e recebo por isso um prêmio de tanto”. Se o navio afundasse ou se morressem escravos, eles pagavam ao mercador o valor estipulado.

No acervo do Instituto dos Seguros do Brasil há arquivos com estas listas, além de contratos sociais de seguradoras, escritos logo depois que D. João VI chegou ao Brasil, uma preciosidade histórica, uma raridade.

Olhar Virtual: Como é atualmente o mercado das seguradoras no Brasil?

O mercado de seguradoras é pulverizado. Atualmente, temos 60 grandes seguradoras no país e existe uma quantidade imensa também de corretores – são mais de 40 mil corretores de seguro operando no Brasil, então o público é muito grande. Além desse mercado de seguradoras, tem uma quantidade imensa de prestadores de serviço. Esse setor cresce numa velocidade impressionante. Só neste ano, deve crescer em torno de 18%. Para ter uma idéia, o faturamento de seguradoras, considerando apenas as empresas de seguros, as empresas de capitalização e as empresas de previdência aberta, deve chegar, neste ano, em torno de 103 a 108 bilhões de reais. É um movimento expressivo em qualquer parte do mundo. Estamos falando em faturamento, em prêmios recebidos. Além disso, uma grande parte desse dinheiro se transforma em reserva técnica, que as empresas aplicam em títulos públicos, com que compram ações, investem. É um mercado imenso: de seguradoras, corretoras e empresas que prestam serviços para seguradoras.

Olhar Virtual: Qual o público-alvo de A história dos seguros no Brasil?

Além do mercado de seguradoras, o livro é uma oportunidade para os estudantes, pois se trata de uma biografia antes praticamente inexistente. Havia algumas coisas esparsas, nós as consolidamos e, na parte histórica, avançamos muito, com uma pesquisa em profundidade.

Olhar Virtual: O senhor então recomendaria a área dos seguros para os estudantes que buscam uma especialização?

Para os estudantes da área de economia, administração e para os que já estão fazendo pós-graduação na área de seguros, este é um mercado que está crescendo muito. Quando eu era estudante dessa mesma faculdade na UFRJ, comecei na área de bancos, no mercado financeiro, especificamente em mercado de capitais e, ainda hoje, sou professor da área de investimento. Mas, se eu estivesse começando minha carreira hoje, começaria no setor de seguros.