Entrelinhas

“Mais do que areia menos do que pedra”

 

 

Rodrigo Baptista

 Inspirado pela efervescência cultural e pelo diálogo com estudantes da Faculdade de Letras (FL) durante o período em que foi diretor da unidade, o professor Ronaldo Lima Lins lança, pela editora 7 Letras, seu 12º livro, o primeiro de poesias: “Mais do que areia menos do que pedra”, no dia 17 de agosto, às 19h, na Blooks Livraria (Praia de Botafogo, 316 Botafogo, Rio de Janeiro). O autor, que possui uma obra literária constituída por romances e ensaios, reúne, neste novo livro, poemas distribuídos em três conjuntos, que tratam de forma sutil dos interstícios: “Mais do que Areia menos do que terra”, “O direito pelo avesso, o avesso pelo direito” e “Chegar para partir”.

Olhar Virtual: Como foi organizado o livro?

Ronaldo Lima Lins: Cada parte tem uma orientação que está no título, portanto dali por diante é uma espécie de voo, que é o voo da poesia pelo universo interior, pela articulação entre interior e exterior, retomada de linhas poéticas de língua portuguesa e estrangeiras sem isolar isso dentro do território de uma nacionalidade específica. É uma forma em que eu experimento essa linguagem da poesia.

Olhar Virtual: Qual foi seu objetivo com esta obra?

Ronaldo Lima Lins: O que tentei foi traduzir em palavras traços da minha existência, da minha aventura existencial. A poesia toca fundamentalmente nisso: ela é ao mesmo tempo, como a filosofia, um voo ao nível da reflexão. Acho que a poesia é um gênero que normalmente se diz uma coisa de jovens, mas isso é uma coisa que se diz porque Rimbaud (poeta francês) escreveu com 16 anos e depois deixou a poesia, mas se você pensar bem, a poesia depurada necessita de uma grande base de experiência humana e experiência intelectual, capacidade de mergulhar nas entrelinhas, nos espaços diminutos. De sair dos espaços diminutos em direção aos mais amplos.

Olhar Virtual: Existem diferenças entre a poesia feita pelos jovens e por pessoas mais maduras?

Ronaldo Lima Lins: Os jovens têm paixão, mas os homens maduros também têm. A poesia é, às vezes, um momento de inspiração, mas ela não pode ser apenas isso. Eu não teria escrito este livro com 16 anos. Eu necessitei dessa bagagem para escrever esta obra. Rimbaud foi uma exceção.

Olhar Virtual: O que é a inspiração?

Ronaldo Lima Lins: A inspiração é aquela luz que de repente se acende, mas ela não basta se o escritor não tiver a noção do ritmo, de estilo. A poesia não é hoje mais rimada. Abandonou-se isso, o que acho positivo, pois se prendia a poesia a uma camisa de força. Ela é muito mais solta, mas ela não abre mão de suas próprias leis. Ela necessita de um ritmo poético. É preciso saber o que dizer e saber como dizer, se não ela não vai funcionar. Só a inspiração sem ter esses ingredientes que você acumulou e aprendeu tornam o trabalho mais difícil.

Olhar Virtual: E de onde veio a sua inspiração?

Ronaldo Lima Lins: Muito da minha inspiração veio do diálogo e contato com os alunos da Faculdade de Letras. Há uma efervescência lá, o que me ajudou a entrar em uma área que não tinha experimentado ainda.  Essa afinidade com o grupo de poetas da Faculdade é um ponto importante. Há vários grupos de poesia lá.  A Roda, Assaltos Poéticos, entre outros. O grupo A Roda, aliás, fará uma apresentação no dia do lançamento de “Mais do que areia menos do que pedra” declamando poemas do livro.

Olhar Virtual: Quais as dificuldades em se fazer poesia no Brasil?

Ronaldo Lima Lins: Um das dificuldades da poesia é que ela não tem espaço comercial. A tiragem é muito reduzida no Brasil, então o espaço é quase nenhum na imprensa, nas editoras. A necessidade de retorno financeiro imediato vai desfigurando o mundo das ideias. Por isso, é importante o universo acadêmico, pois se mantém uma chama dessas coisas que não tem valor comercial. Ali na FL há um público. Eles levam adiante essa afinidade.

Olhar Virtual: Escrever é um diálogo entre o escritor e o leitor. Como vai ser o seu bate-papo com ele neste livro?

Ronaldo Lima Lins: Minha conversa com ele é uma conversa sobre a vida. Sobre as questões fundamentais da vida. Dialogo através daquilo que buscamos entender, mas que não possui respostas. É um ponto de partida para reflexão.  Não é um poema apenas para sentir, mas questionar a ideia de paisagem. A leitura é um diálogo que se trava consigo mesmo. É uma experiência existencial.

Olhar Virtual: O que quer dizer com o título?

Ronaldo Lima Lins: A capa reproduziu de certa maneira a ideia contida no título, que é a noção de interstício, no caso da capa, a sombra formada entre a areia e a pedra e que não é nenhuma das duas. Há um espaço entre uma coisa e outra. O conceito geral desta obra é, posto de forma sutil, a ideia dos interstícios existentes na vida. Esse título faz parte de minha busca pessoal, mas o fundamental da busca não é encontrar algo, mas o processo. Chego para partir outra vez. Encontrei uma ideia, me apaixonei por ela, morro e vivo por ela, mas já chegou o momento de deixá-la.

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