Especial Eleições - Chapa 12

“Paz sem justiça não é paz, é só trégua”

 

Pedro Barreto

 

.

Professor titular do Instituto de Economia (IE) da UFRJ, Alcino Câmara defende a transformação da UFRJ em um “instrumento de justiça social”. Para isso, o candidato acredita que é necessário reformular o atual estatuto, fortalecendo a vinculação entre Ensino, Pesquisa e Extensão. No que diz respeito ao acesso, o docente afirma ser necessário, além da adoção de uma política de cotas sociais provisória, um processo que comece na Educação Básica e vá até o Ensino Superior.

O professor é favorável, ainda, à expansão dos cursos noturnos, de forma a “demandar, junto com a sociedade, uma cruzada pela expansão da universidade”. Para a carreira dos servidores docentes,

Definindo-se como “candidato das esquerdas”, o docente prega que “paz sem justiça não é paz, é trégua” e pede o voto do eleitor dizendo que fará “justiça ao trabalho hercúleo que professores, técnico-administrativos e estudantes da UFRJ desenvolveram nos últimos anos”.

Olhar Virtual: Em sua opinião, qual o perfil do profissional que a UFRJ forma e qual ele deveria ser?

Alcino Câmara Neto: Eu avalio que não se pode falar de uma forma genérica, pois a UFRJ ainda é uma federação de unidades. Mas ela tem, como a universidade brasileira, um caráter extremamente profissionalizante. Na medida em que se expande o percentual de jovens na universidade, crescem também as possibilidades e o próprio perfil também deixa de ser apenas o de formação profissional. Eu acho que tem sentido formarmos jovens de várias profissões e tem sentido também ter formações plurivariadas e pluralistas. E esta pode ser a meta que a gente persiga. Mas a gente tem que, concomitantemente a isso, trabalhar a expansão, que foi pífia em certo sentido, ainda que tenha se defrontado com vários percalços.

Olhar Virtual: Muito se discute sobre a necessidade de alterações no estatuto da UFRJ. Por onde essa mudança deve começar?

Alcino Câmara Neto: A “Estatuinte” deve definir isso. Do ponto de vista administrativo-organizacional, eu defendo algumas mudanças que já são até consensuais no Conselho Universitário (Consuni): a criação de um conselho acadêmico, reunindo o Conselho de Ensino de Graduação (CEG), o Conselho de Ensino para Graduados (CEPG) e a área de Extensão, não porque eu tenha alguma coisa contra esses dois colegiados. Mas sim, por que isso reduziria o percentual de conflitos, poria num outro patamar às decisões do colegiado acadêmico e permitiria pensar a universidade de forma integrada. Outra coisa é a clara definição das atribuições dos vários níveis hierárquicos da universidade. A gente acredita que há níveis demais. Mas eu não sei se isso necessariamente é verdade. Há que se definir suas funções e tarefas. Há centros, estrutura que é a mais combatida na UFRJ, que têm uma série de atribuições e outros que não tem atribuição nenhuma. Então a gente tem que repactuar esse pacto federativo, definindo se é para ter departamento, o que é um departamento; e definir os níveis e suas atribuições. Do ponto de vista da estrutura acadêmica, a gente tem que vencer certos entraves à transformação dessa universidade. Um deles é a figura do conhecido crédito externo que infelicita uma parte da universidade. Os alunos têm que entrar e fazer suas disciplinas juntos. Isso é assim em todas as partes do mundo e aqui na UFRJ impera o pensamento de que “a disciplina é minha”. Misturar é um passo no sentido de desfazer esse expediente que desestimula tanto aluno quanto professor. É obvio que o alvo maior é a criação de ciclos básicos comuns por áreas, em que o estudante ingressa e, a partir de uma visão geral de sua área, ele pode ir para uma ou outra direção profissional. Isso é que eu quis dizer em termos de revolução. Também falei da própria atitude em sala de aula. Nossa aula ainda é pensada como algo ainda extremamente informativa e não reflexiva. E hoje, com a internet, os jovens têm acesso a um volume de informações fantástico. Então a gente tem que repensar a forma de ensinar e também levar em conta a integração, na sala de aula, de Ensino, Pesquisa e Extensão, onde isso couber. Ou seja, na verdade, o trabalho de aprendizado pode ser menos passivo e pode ser um projeto de pesquisa desenvolvido pelo aluno associado a um professor, no sentido de, em vez de pescar o peixe para o aluno, ensinar o aluno a pescar. Também nessa área, temos que dar espaço para a criatividade, seja de alunos ou de professores. Hoje em dia, os currículos mínimos são imensos e quase máximos, porque todo mundo acha importante aquilo que ensina e as pessoas ficam muito preocupadas com associações profissionais que não tem que se sobrepor à autonomia universitária. A gente tem que pensar novos conteúdos, articulações. Eu acredito que não se viabilizam novos currículos abertos somente pelo fato de se propor apenas três ou quatro disciplinas de livre escolha. Mas, ao invés disso, permitir que alunos venham propor determinadas formações desde que devidamente respaldadas por um orientador acadêmico. Isso nos leva a outra temática. Então, o aluno deve estar – e essa deve ser uma luta da universidade, assim como do professor e do técnico-administrativo – presente em tempo integral. Mas, para isso, a universidade tem que se transformar. O aluno em tempo integral modifica inteiramente a forma de aprendizado e de pesquisa. Seja pelo fato de estar aqui, disponível, e multiplicar nossa capacidade de trabalho e pesquisa, ou pelo fato de que isso demandará do professor muito mais flexibilidade de horário.

Olhar Virtual: Como o senhor avalia o papel da Extensão na universidade?

Alcino Câmara Neto: Como candidato das esquerdas, digamos assim, nós sempre tivemos uma reflexão sobre a importância da Extensão. Isso não se desatualizou. Estive na aula do professor Jose Paulo Neto, da Escola de Serviço Social (ESS), para o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), e fiquei encantado com as múltiplas capacidades extensionistas dessa universidade. Também estive no Hospital Escola São Francisco de Assis (Hesfa) da UFRJ, que é uma unidade que se volta para o atendimento primário à Saúde. A universidade deve ensinar e aprender com a sociedade e deve se abrir para ela. Há vários trabalhos de Extensão que devem ser priorizados. Por exemplo, como eu defendo que nós assumamos um papel maior na área do Ensino Fundamental e Médio, não no sentido de ministrar, mas no sentido de formação de docentes e de apoio a essas escolas. Como disse Anísio Teixeira, a universidade teria que abraçar o ensino público de primeiro e segundo graus. E isso é muito atual. Eu acho que a universidade não resolverá a questão da Extensão simplesmente recorrendo ao sistema de cotas. Isso é muito pouco comparado ao que se pode fazer. Temos que ter as cotas, mas temos que ter todo um processo de qualificação nas escolas fundamental e média. E este deve ser um dos eixos centrais da Extensão. Outro trabalho que é muito importante é na área da Educação Física. Estamos em um decênio olímpico e de Copa do Mundo. Você não cria um atleta no final da adolescência, mas, sim, na tenra infância. Portanto, há que haver um trabalho. Eu pretendo criar uma coordenação associada às atividades esportivas visando às Olimpíadas. Acho que é uma atividade extensionista importante e há recursos para isso. Nós temos que ajudar a nós mesmos, em particular a Escola de Educação e Desportos (EEFD) da UFRJ, no sentido de produzir projetos este ano e captar recursos.

Olhar Virtual: Dentro de uma estrutura administrativa da universidade, como o senhor avalia o papel da Comunicação Institucional?

Alcino Câmara Neto: Existe um projeto da institucionalização da Coordenadoria de Comunicação (CoordCOM) em Superintendência Geral de Comunicação Social (SGCOMS), que eu assino embaixo. Eu acho que são extremamente importantes os canais de comunicação. Acho que eles devem ser difundidos pela estrutura hierárquica. Vejo com enorme simpatia que existe uma revista no Centro de Ciências da Saúde (CCS) e também acho interessante a revista do Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas (CCJE), a Versus, da qual eu sou editor. Ela até não tem condições de ser mantida pela Decania e avalio que ela deva ser assumida pela Superintendência. Acho que a gente tem que ter vários outros instrumentos de Comunicação. Estamos muito atrás no que concerne à tevê. A Estácio de Sá e outras universidades dominam boa parte da TV Universitária e nós não temos tanto espaço assim. Nós temos que ter o nosso próprio canal universitário, não só para difusão na internet, como em canal fechado, aberto, para toda a sociedade. Por que a gente não pode sonhar com uma TV Universidade do Chile, com uma TV Cultura de São Paulo na UFRJ? Eu acredito que é essa a meta. A Universidade Autônoma do México (Unam) tem uma rádio, uma tevê e um jornal de grande circulação.