Olho no Olho

Intrigas midiáticas

Vanessa Sol

Imagem olho no olho

É cada vez mais comum ver os meios de comunicação se ocupando em produzir escândalos, sobretudo no atual momento político, em que quaisquer gestos e ações tornam-se motivo de intrigas palacianas. No entanto, esta não é uma prática que está restrita à cena política, generalizando-se entre outras áreas de atuação da cobertura jornalística.

Para debater sobre o tratamento que a mídia dá aos fatos, transformado-os em espetáculo, o Olhar Virtual entrevistou a diretora da Escola de Comunicação, professora Ivana Bentes, e o diretor da Faculdade de Letras, Ronaldo Lima Lins.

 

 

Ivana Bentes
Diretora da Escola de Comunicação

"O ministro da Cultura foi à Escola de Comunicação dar uma aula de democracia e de comunicação. No entanto, acabou citando o ministro das Comunicações, Hélio Costa, a partir de um terceiro.

De tudo que Gil falou, que foram coisas importantes sobre a democratização dos meios de comunicação, tv digital, pontos de cultura, só ficou isso. A partir deste fato, acho que tem a fulanização da imprensa, o que é terrível. Os meios de comunicação, os jornais acabam funcionando com uma “candinha” pós-moderna. Este tipo de jogo fulanizado, parece-me que é jogar a política um pouco no varejo e descontextualizar.

De tudo isso, ficou essa declaração descontextualizada, com isso se cria um fato que, quem estava na Escola de Comunicação, na aula inaugural não viu – uma polêmica, um embate de cordel que não existiu. Isso é folhetinesco, é fait-divers. Esse tipo de trabalho é preocupante. Isso já aconteceu com a dança da petista, que virou a dança do escárnio, ou seja, um pequeno gesto é ampliado de maneira que vira um fait-divers.

É claro que todas estas ações são políticas, principalmente, porque estamos num ano eleitoral e qualquer gesto ou palavra ganha repercussão desmedida. Mas é claro que essa atitude da mídia é política e parcial.

A questão não foi analisada pela mídia por inteiro. Com isso o fato foi espetacularizado, parcializado, fulanizado. Virou briga do Gil com o ministro Hélio Costa e não o posicionamento político do Ministério da Cultura, que tem uma posição crítica em relação ao das Comunicações.

O fato foi descontextualizado, pois foi enunciado por Gil de maneira humorada, democrática e dentro de um outro contexto.

Em um governo democrático, o fato de se ter dois ministérios com políticas diferentes é inusitado, mas pode acontecer. Estamos vivendo exatamente este momento. Ministérios da Cultura e das Comunicações com posturas distintas em relação à democratização dos meios de comunicação. Ao invés de colocar isso claramente e o porquê desta oposição política, eles (mídia) fulanizam. Da forma como a mídia coloca os fatos, vira briga pessoal do Gil com Hélio Costa."

Ronaldo Lima Lins
Diretor da Faculdade de Letras

"A época está marcada por um conceito de estética muito diverso daquele sentido que tinha originalmente. Hoje, o que se tem é uma espécie de estética inestética. Dentro disso, a mídia tem um lugar de destaque, no sentido de que há um esforço dela para ficcionalizar as coisas e dar a elas o sentido de estética, o que é falso. Como se as pessoas vivessem uma experiência e pensassem que ela não existe e o que existe é uma coisa irreal, montada com aparência de realidade. Por exemplo, a televisão atua como uma estética no sentido que ela tem uma linguagem que se organiza de acordo com seus próprios princípios. Se vemos muita televisão todos os dias temos a impressão de que nossa vida está errada e o certo é o que está na televisão.

Os jornais começaram a existir na Europa depois da Revolução Francesa. Criaram-se muitos jornais que eram autênticos e muito próximos do povo. O contato de quem fazia o jornal com o público era muito grande, independente de o fato ser verdade ou não. À medida que o jornalismo cresceu muito, o contato passou a ser indireto e o elemento de ficção, de escapamento da verdade, cresceu muito. E a mídia passou a ser movida pela competição, no sentido do escândalo. Se for possível fazer escândalo então, supostamente, a mídia se alimenta dele. Muitas vezes há escândalos que são criados artificialmente.

A partir de um determinado momento, a mídia passou a competir para ver quem faz o escândalo maior, independentemente da realidade ou não. Ela começa a constituir um tipo de estética que não tem nada a ver com a verdade e acaba sendo inestética, porque em vez de ser uma harmonia com a idéia da perfeição, é uma harmonia simplesmente ficcional, que não tem nada a ver com a realidade.É uma outra harmonia, que podemos chamar de estética cosmética.

A mídia vive desses pequenos escândalos, não importando se as bases deles são verdadeiras ou não. Hoje em dia, este é um problema de referência em relação à realidade, difícil de desmontar. E todos nós somos vítimas disso.

"