Entrelinhas

Corpos letrados, corpos viajantes

Julia Vieira

capa do livro

Luiz Edmundo Bouças Coutinho, professor de Literatura Comparada da Faculdade de Letras e Flora De Paoli Faria, vice-decana e coordenadora dos Programas de Pós-Graduação do Centro de Letras e Artes (CLA/UFRJ), lançaram no final de 2007 o livro Corpos-Letrados, Corpos Viajantes. A obra organizada pelos docentes é composta de 19 ensaios que tematizam a Belle Époque brasileira, ocorrida no final do século XIX e nas duas primeiras décadas do século XX.

“Corpos-letrados, Corpos-Viajantes” é o quarto livro de uma série resultante de anos de estudos acerca da temática do Decadentismo. “Arte e Artifício – Manobras de Fim de Século”, “O Labirinto Finissecular e as Idéias do Esteta” e “Dândis, Estetas e Sibaritas” completam a coleção, a ser complementada em breve após um novo encontro, previsto para junho, na Biblioteca Nacional, sobre parcerias textuais no Decadentismo. 

Em entrevista ao Olhar Virtual, Luiz Edmundo Bouças Coutinho, um dos organizadores do livro, fala sobre a idéia de publicar a obra e sobre a Belle Époque brasileira.

Olhar Virtual: Como surgiu a idéia de organizar a obra?
Existem dois grupos de pesquisa, vinculados ao CNPq e à Faculdade de Letras, que têm como objeto de estudo ao temário da Belle Époque carioca. O Ressonâncias do Decadentismo na Belle Époque brasileira e o Estéticas de Fim de Século. Tivemos diversas publicações a respeito dos resultados de nossas pesquisas. Este livro provém de propostas acerca do tema com um certo tom ensaístico. São 19 ensaios apresentados por ocasião do 3° Colóquio Ressonâncias do Decadentismo na Belle Époque brasileira e do 8° Colóquio Estéticas de Fim de Século, realizados entre os dias 27 e 30 de novembro de 2006. É um trabalho de repercussão interessante em termos de resultado de pesquisa.

Olhar Virtual: Por que estudar esse momento em especial?
O que me parece interessante é o tema, pois sabemos que o Decadentismo é um assunto pouco mencionado no Brasil, onde muitos até confundiam o decadentismo com o simbolismo. É uma presença muito interessante na Belle Époque brasileira. Outro ponto interessante é a conjunção da literatura com a manifestação da arte. Dentro da Belle Époque havia a produção da literatura, da arte e também do Art Noveau. A literatura não é apenas circunscrita, ela tem conjunção com todas as outras modalidades de manifestação da arte.

Olhar Virtual: Qual a diferença entre simbolismo e decadentismo?
Em princípio, o decadentismo é anterior à presença do simbolismo, mas dentro do cenário brasileiro, particularmente no Rio de Janeiro da Belle Époque, havia uma conjunção entre o Art Noveau, o decadentismo e o simbolismo.

Olhar Virtual: Qual o principal tema abordado nos ensaios do livro?
O principal tema é a viagem. João do Rio, um dos maiores artistas do decadentismo, por exemplo, ao chegar em Lisboa celebrou a presença marcante de Portugal no Brasil. A presença do corpo-viajante e de uma espécie de circuito se configuram dados significativos para o temário desta obra.

Olhar Virtual: Quais os principais artistas do período decadentista?
Paulo Barreto, o João do Rio, é considerado um dos grandes articuladores do Decadentismo. Todos os decadentistas tinham em comum o fato de serem herdeiros de Baudelaire. A herança conferida aos intelectuais deste momento era a articulação de idéias como a figura do flâneur - um ser errante, um vagabundo – alguém que perambula pela cidade sem propósito aparente, mas secretamente em harmonia com a sua história e numa busca velada de aventura, seja ela estética ou erótica; e do dândi – aquele que exibe uma maneira lúdica de viver, em que a estetização do homem, das coisas e das relações é constante. O João do Rio optou por ser um dândi e também um flâneur. Em obras como “Dentro da Noite” e “A mulher e os Espelhos”, prosas de ficção marcadoras dos contos, João do Rio atualizou as pistas de um caráter desafiador, mobilizando um coro de escritas capaz de enfrentar o discurso biopolítico. E dedicou-se também à questão da corporeidade.

Olhar Virtual: Paulo Barreto decidiu escrever sob um pseudônimo. Mas, por que João do Rio?

É uma proposta onde ele se assume como um ser da cidade, voltado a tematizar comentários sobre as transformações ocorridas no Rio de Janeiro.