Ponto de Vista

Surge um novo cenário geofísico no Brasil?

Vanessa Sol

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No último dia 22 de abril, um terremoto atingiu a costa brasileira. O abalo sísmico marcou 5,2 graus na escala Richter e foi sentido em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina. Entretanto, o epicentro do tremor ocorreu no mar, cerca de 215 km distante de São Vicente, em São Paulo.

Porém, esse não é o primeiro caso de terremoto no país. Em 14 de novembro de 2007, outro tremor foi sentido em várias áreas da cidade. O tremor foi reflexo de um terremoto ocorrido no Chile poucos minutos antes.

No ano passado, o Brasil registrou também a primeira morte causada por tremores de terra. Um terremoto de 4,9 graus na escala Richter atingiu a comunidade rural de Caraíbas, em Itacarambi, no norte de Minas Gerais. Todos os 76 imóveis da localidade sofreram algum tipo de avaria e uma menina de cinco anos morreu.

Outro fenômeno ocorreu na região de Sobral, no norte do Ceará. O tremor atingiu 3,9 graus na escala Richter, de acordo com o laboratório de sismologia da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte).

Os estudos, até hoje, mostraram que o Brasil se encontrava numa área de estabilidade por estar no centro de uma placa tectônica. No entanto, a recorrência dos fenômenos sismológicos tem feito os especialistas pensarem que, talvez, tenha chegado a hora de investir em pesquisas para um diagnóstico mais preciso sobre a possibilidade do Brasil estar numa área já não tão estável.

Em entrevista ao Olhar Virtual, a professora de geofísica do Instituto de Geociências da UFRJ, Paula Ferrúcio, afirmou a importância de construir uma rede de pesquisa avançada para o diagnóstico de um novo cenário, além de investimentos em educação, qualificação de profissionais e adaptação das leis voltadas para a construção civil, caso um novo cenário seja confirmado.

Olhar Virtual: O Brasil está localizado no centro da placa tectônica Sul-americana, o que lhe confere certa estabilidade. Se ele está localizado em uma área estável, o que ocasionou o terremoto?

Quando olhamos o mapa de placas tectônicas, vemos que o Brasil está localizado no centro de uma grande placa, a Sul-americana, proporcionando-lhe alguma estabilidade sismológica. Porém, a borda desta placa está situada na dorsal meso-atlântica, que segue até o Atlântico Norte, um lugar irregular onde ocorre a divergência entre as placas Sul-americana e Africana. Há uma separação entre elas e velocidade de afastamento é da ordem de 1 centímetro ao ano. Na região onde as placas estão se separando há uma espécie de lineamento transversal – são fendas ocasionadas pelo movimento das placas tectônicas, e, provavelmente, o movimento de uma dessas fendas provocou o terremoto do dia 22 de abril.

A respeito deste evento, é preciso pensar se este foi um fenômeno isolado. Se ele foi único, não há como prever outros. Mas vale a pena investir e fazer um esforço conjunto voltado para a pesquisa sísmica. Seria interessante criar uma rede de estudos em geofísica com o intuito de averiguar se a região tornou-se uma área de instabilidade tectônica. Acreditamos estar em uma área estável, mas pode ser que esta realidade tenha mudando.

Valeria a pena, então, fazer um estudo para avaliar o grau de risco desta área? Quando se conhece as características há como agir diante das situações, mas quando se desconhece não há como recorrer. Não há como prever um terremoto, mas, através de estudos, há como diagnosticar uma área de instabilidade.

O Brasil tem uma costa imensa e densamente povoada, então, vale a pena as universidades estudarem estes fenômenos sismológicos. No futuro, os movimentos tectônicos podem provocar estragos de proporções imensuráveis.

Olhar Virtual: A extração de petróleo pode ser um fator motivador para a ocorrência de abalos sísmicos no Brasil?

A quantidade de petróleo que vem sendo retirada, hoje, dos reservatórios que temos não é significativa para causar abalos sísmicos. O que foi retirado não causa colapso nos reservatórios, que seria a instabilidade do local provocando o desmoronamento do reservatório e conseqüentes abalos, porque a água do mar preenche o lugar do óleo que saiu.

Em alguns casos, pode até haver instabilidade local, mas não é caso da Bacia de Santos porque não foi retirada uma quantidade de óleo que pudesse provocar um colapso, ainda mais a 10 km de profundidade, distância que ocorreu o terremoto. Em geral, os reservatórios estão a 5 km. Ou seja, o terremoto jamais poderia ter sido causado pela extração do petróleo. É mais provável que tenha ocorrido pela abertura de alguma das falhas existentes no assoalho oceânico em função da divergência das placas tectônicas.

Olhar Virtual: Se ficar reconhecido que o país se encontra em uma área de instabilidade, o que é preciso ser feito para o enfretamento desta questão? As construções civis estão preparadas para sofrer constantes tremores de terra?

Não existe no Brasil uma cultura de terremotos como há em outros países. Então, não temos construções civis adaptadas a esta realidade. Em geral, em países onde os abalos sísmicos são comuns, são usadas molas, que amortecem o impacto provocado pelos tremores, nas fundações das estruturas dos prédios. No Japão e no México, por exemplo, os edifícios são construídos desta maneira já prevendo a possibilidade de terremotos.

A criação de uma rede de estudos em geofísica seria interessante porque integraria diversas universidades e diferentes cursos no processo de pesquisa sobre as recorrentes manifestações sísmicas no Brasil e poderia confirmar também se o país, agora, encontra-se em uma área tectonicamente instável. Desta maneira, ficaria muito mais fácil pensar em soluções para a construção civil, que precisaria ter sua legislação modificada se de fato ficasse confirmado que o país já não se encontra em uma área tão estável.

Outra questão relevante é a educacional. Se o um novo panorama for confirmado com estudos, será necessário qualificar os profissionais do magistério, educar e preparar a população para saber como proceder em caso de terremotos.

O atual momento pede investimentos na área, pois só assim será possível fazer um diagnóstico para as gerações futuras de modo que elas saibam com qual realidade tem de lidar. Cabe às universidades encaminhar este processo.