De Olho na Mídia

Liberdade de informação

Rodrigo Lois – AgN/Praia Vermelha

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Muitas vezes, grandes reportagens, denúncias e “furos” jornalísticos são frutos de investigações elaboradas, formadas a partir de informações oriundas de diversas fontes, freqüentemente não reveladas. O sigilo em relação à fonte é intrínseco à liberdade de expressão da imprensa, ou seja, ao direito de manifestar qualquer opinião ou informação. Além disso, a liberdade de imprensa é essencial para a manutenção de um regime onde discursos e visões políticas são diferentes, como é o caso da atual democracia brasileira.

No último dia 25 de setembro, na sede da Academia Brasileira de Letras (ABL), situada no Centro do Rio de Janeiro, intelectuais e jornalistas defenderam a preservação e continuação do sigilo sobre a origem das informações na imprensa como uma das garantias da liberdade de expressão, citada in loco como um dos pilares da democracia. O manifesto foi uma reação ao discurso do Ministro da Defesa, Nelson Jobim, que, em depoimento na CPI dos Grampos, sugeriu que a imprensa seja obrigada a revelar suas fontes em alguns casos.

Durante o encontro, especialistas também comentaram a falta de acesso de parte da população a jornais e livros, o que ameaça o sentido pleno da liberdade de imprensa. Essa impossibilidade de leitura está ligada principalmente à precariedade da educação brasileira. “Não basta a possibilidade de os veículos de informação funcionarem. É preciso que a sociedade seja livre também”, afirmou o jurista Célio Borja, um dos presentes no debate da ABL.

Para mergulhar nessas questões e em outros tópicos relacionados a elas, o Olhar Virtual entrevistou Tiago Lemos Monteiro, professor da Escola de Comunicação (ECO) da UFRJ.

— Quando se concebe algo que possa ser semelhante a uma obstrução à liberdade de imprensa, pensa-se geralmente em qualquer tipo de controle, de interferência, enfim, no bom e velho fantasma da censura. O que realmente está incomodando é o medo de que se retorne a um estágio anterior, onde existia a censura aos meios de comunicação – afirmou Tiago Monteiro, quando questionado sobre os possíveis motivos para a manifestação que ocorreu na ABL.

Como foi dito anteriormente, o sigilo sobre a fonte é uma das marcas do fazer jornalístico, pois é, a partir de seus relatos que uma reportagem, é construída. Porém, dependendo da situação, esse segredo pode atrapalhar certos esclarecimentos para a sociedade. É o que aponta o professor: “Há casos e casos. Em certas situações, o indivíduo deve manter o sigilo da fonte, pois, ao revelá-la, a fonte pode correr algum risco, seja profissional ou até de vida. Com isso, o fluxo de informações é interrompido. Porém, em outros casos, não revelar de onde veio a informação pode obstruir uma investigação ou desdobramento de reportagem. Portanto, o importante é pensar que a função social do jornalista não termina quando sua reportagem é publicada”.

Ainda segundo Tiago Monteiro, a ação promovida pelos intelectuais e jornalistas na ABL deve causar algum impacto. “Ao longo da História do Brasil, a mídia sempre teve grande força política. Com isso, qualquer manifestação desse grupo social sensibilizará de alguma forma as autoridades do governo”.

No ato, defendeu-se o respeito à liberdade de imprensa, e conseqüentemente ao sigilo sobre a fonte, como peças importantes para a manutenção de uma mídia livre e democrática. Mas podemos conceituar a mídia brasileira como efetivamente democrática?

— De fato, não há um controle político declarado, uma censura declarada, um controle sobre a circulação da informação como havia na época da Ditadura Militar. Por outro lado, até que ponto determinados interesses econômicos de grupos editoriais e empresas de comunicação, que pautam etapas do fazer jornalístico, não podem ser considerados como bloqueio à informação e um entrave à liberdade de imprensa? Isso deveria ser discutido também, mas não é, porque dessa forma estaríamos mexendo com forças muito maiores e com a configuração da indústria de comunicação como um todo – responde Tiago Monteiro.

Ao contrário do discurso do senso comum de simplesmente “dar voz” aos diversos setores da sociedade, vozes essas que são mediadas, coordenadas e centralizadas em somente uma que organiza o discurso e que não se identifica totalmente com as outras, o professor da ECO propõe um outro tipo de postura para solucionar esse quadro. “Descentralizar a mídia passa por oferecer condições técnicas, financeiras e educacionais para que as diversas vozes encontrem formas próprias de se expressar, tanto em forma de texto, imagem ou audiovisual. Elas também precisam de meios para serem ouvidas. A Internet pode atuar muito bem nesse sentido, aliás muito mais do que programas de rádio ou televisão. Porém, isso tudo colide com a tendência da mídia de se fechar em conglomerados e grandes empresas”.

As diversas instâncias acadêmicas, tanto universidades como estudantes, poderiam contribuir bastante na promoção de uma mídia mais democrática e na capacitação de indivíduos e grupos sociais que não têm condições de se expressar. Porém, não é de forma positiva que Tiago Monteiro enxerga a possibilidade desse tipo de ação no futuro: “Fica muito difícil realizar a democratização, se a projeção do futuro das pessoas for somente ir para universidade para assim conquistar uma vaga nas grandes empresas de comunicação. É uma visão extremamente pragmática que domina a maioria. Mas, por outro lado, não podemos ser ingênuos e achar que é possível viver bem nesse mundo cruel, só baseados no trabalho em células pequenas de transmissão de conhecimento. É preciso que sejam desenvolvidas políticas públicas que permitam o desenvolvimento do processo”.