De Olho na Mídia

Show da vida e da morte de Michael Jackson

Heryka Cilaberry


Exibido ao vivo por emissoras de todo o mundo, o funeral do “rei do pop” Michael Jackson, morto em decorrência de parada cardiorrespiratória no último dia 25, foi acompanhado por cerca de um bilhão de pessoas de diversos países. O último adeus ao cantor marcou uma disparada na audiência dos canais de TV a cabo, que pode ser comparada à transmissão da última eleição presidencial americana.

De acordo com a Nielsen Media Research, empresa que afere a audiência nos Estados Unidos, apenas nos domicílios daquele país, quase 31 milhões de pessoas assistiram aos 18 canais que mostraram o funeral do astro, com cerca de três horas de duração. Em pontos de audiência, o espetáculo fúnebre significou resultado mais expressivo que um episódio de American Idol, popular concurso de talentos musicais exibido por um canal de TV a cabo.
A extensa cobertura da morte de Michael Jackson levou alguns críticos a perguntar se não estaria havendo um exagero por parte das empresas de mídia. A diretora da Escola de Comunicação (ECO/UFRJ), Ivana Bentes, concorda com a existência de uma supervalorização do assunto, mas não acredita na exploração da imprensa sobre o tema.

“Acho que há uma curiosidade muito grande, um interesse em acompanhar a vida de uma celebridade. Sem dúvida, essa cobertura 24h é exagerada, entretanto é um exagero demandado pela própria audiência. Trata-se de um círculo vicioso alimentado por todos nós”, analisou Ivana.

O exagero também foi apontado pelos próprios espectadores. Segundo dados divulgados pelo Pew Research Center for People and the Press, 64% das pessoas declararam que as organizações noticiosas estavam dedicando tempo e espaço demais à cobertura da vida e morte do autor dos sucessos “Thriller” and “Black and White”.

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, também expressou indignação. Segundo ele, haveria um posicionamento político que guiaria a imprensa no sentido de dedicar mais atenção à morte do músico que ao golpe de Estado em Honduras, ocorrido no mesmo período. “Concordo que há uma decisão política. Entretanto, os instrumentos estão aí. Para quem deseja saber mais sobre um evento, há diversos sites que publicam informação 24h sobre determinados assuntos”, salientou Ivana Bentes.

Para a diretora da ECO, existe desinteresse político por parte da mídia, que mantém um certo fascínio por assuntos ligados ao mundo do entretenimento. “Essa compulsão é cultural, responde ao estilo de cada país. No Brasil, há uma tendência à notícia folhetinizada, uma novela do real”, comentou Ivana, lembrando a maneira como a cobertura da queda do avião da Air France foi carregada de emoção no Brasil, diferente da cobertura francesa.

O uso intensivo da internet e o aparecimento de mídias alternativas como fonte de informação foram também a marca da cobertura sobre Michael Jackson. A divulgação da morte com exclusividade pelo site TMZ, voltado para o universo das celebridades, representou uma mudança nas estruturas tradicionais de divulgação, que têm as grandes emissoras como principais fontes de informação.
“A internet já está concorrendo há um tempo e ganhou credibilidade. Há  número grande de pessoas que se informa através de sites, inclusive mais que pelos jornais. Uma marca disso é a queda na venda dos impressos nos Estados Unidos”, explicou Ivana.

A diretora credita a mitificação de uma personalidade controversa como a do astro pop, já acusado de pedofilia, a um relaxamento do espírito crítico. “Depois de momentos de comoção, deve existir um momento de avaliação. É uma amnésia social temporária. A princesa Diana é um exemplo disso. Quando ela morreu, se tornou um ícone. Mas hoje o que sobrou? A moça bonita casada com o príncipe. Depois dessa amnésia temporária, volta o espírito crítico”, refletiu.

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