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Estudo compara favelas indianas e cariocas

Aline Durães


A Índia está na moda. O filme Quem quer ser milionário? ganhou, em 2009, oito estatuetas do Oscar – entre elas a de Melhor Filme –, arrecadou US$ 150 milhões nas bilheterias e pôs em evidência mundial a cultura indiana. Por aqui, a novela global Caminho das Índias ajudou a aguçar o interesse dos brasileiros por esse país do sul da Ásia. Cada vez mais, a culinária, as danças, a religião e os costumes indianos têm ganhado visibilidade.

Apesar disso, muitos dados da realidade da Índia permanecem fora dos holofotes da mídia. Para entender um pouco mais acerca das dificuldades enfrentadas por esse país, o Núcleo de Pesquisa e Extensão Favela e Cidadania (Faci), da Escola de Serviço Social (ESS) da UFRJ, participa de um estudo comparativo com pesquisas em políticas públicas em favelas da Índia e do Brasil. Coordenado pela França, o estudo reúne também pesquisadores de São Paulo e das cidades indianas de Nova Delhi e Bombaim (ou Mumbai).

Como parte do estudo, intitulado Social Exclusion, Territories and Urban Policie: comparison between India and Brazil (“Exclusão Social, Territórios e Policiamento Urbano: comparação entre Índia e Brasil”), pesquisadores da ESS estiveram presentes em favelas da Índia. Entre outras, visitaram a de Dharavi, considerada a maior da Ásia, com cerca de 700 mil habitantes. A equipe constatou que as comunidades na Índia são mais precárias se comparadas às cariocas. Banheiros coletivos, por exemplo, são instalados nas favelas, visto que as casas indianas não possuem sanitários. “As favelas indianas se auto-organizam. As famílias se dividem, entre as diversas regiões, em função do trabalho que executam”, explica Maria de Fátima Cabral, professora da ESS integrante da pesquisa.  

Maria de Fátima elucida que as políticas de urbanização na Índia costumam remover os moradores de favelas das zonas centrais e realocá-los em uma periferia remota, algumas vezes em zonas que não serão urbanizadas. A mudança para locais mais distantes, de acordo com o estudo realizado pela docente, dificulta o acesso a emprego, escola e posto de saúde das populações excluídas.

A pesquisa no Rio

O Faci, no Brasil em específico, tem a missão de analisar o impacto da urbanização nas favelas de Praia da Rosa e Sapucaia, na Ilha do Governador, pela Prefeitura do Rio de Janeiro, através do Programa Bairrinho, entre 1996 e 1998. Semelhante ao Favela-Bairro, o Programa Bairrinho atuou em comunidades de pequeno porte (de 100 a 500 domicílios), visando integrar essas áreas à cidade, através da implantação de infraestrutura urbana, equipamentos e serviços públicos.

A pesquisa realizada pela UFRJ foi dividida em duas etapas. A primeira delas, concluída no ano passado, consistiu em entrevistas com moradores e pessoas diretamente envolvidas no Programa. A segunda, ainda em execução, avalia, através da atualização do banco de dados construído com base no censo de 1996, quais as principais modificações realizadas nessas comunidades e aponta quais aspectos permaneceram inalterados.

De acordo com Maria de Fátima Cabral, os primeiros resultados da pesquisa mostram que, embora o processo de urbanização tenha sido iniciado, não houve um acompanhamento adequado das melhorias físico-urbanísticas, o que implicou a deterioração das obras.

Proximidades e distâncias

Brasil e Índia guardam distâncias consideráveis entre si. Entre as diferenças, destaca-se a questão da violência. Ao contrário do que acontece nas favelas do Rio de Janeiro, não há presença de tráfico nas comunidades indianas. Os conflitos violentos ocorridos na Índia possuem fundo religioso.

Alguns aspectos em comum, no entanto, permitem traçar estudos comparativos como esse do qual a ESS participa. Além de serem emergentes, Brasil e Índia passaram por processos semelhantes no que diz respeito à intervenção em favelas no período pós-globalização. Segundo a pesquisa, os dois países apresentam um processo de urbanização marcado por desigualdades socioespaciais e pela falta de continuidade das políticas implantadas em favelas.

O estudo verificou também que, em todas as cidades analisadas, a disputa por investimentos se acirra por ocasião de eventos esportivos, como a Copa do Mundo, por exemplo. “As cidades têm que mostrar uma imagem mais bonita, que não comporte a pobreza e a violência. As intervenções do tipo upgrading podem ser observadas em Mumbai e no Rio (Programa Favela-Bairro). Esses programas de intervenção em favelas contam com o financiamento de organismos multilaterais, como Banco Mundial, BIRD etc.”, diz o estudo.