Edição 237 03 de fevereiro de 2009
Algumas das mais poderosas indústrias nacionais começaram o ano anunciando cortes em seus quadros de pessoal. A grande vilã dessa história é a crise econômica, iniciada nos Estados Unidos e alastrada por todo o mundo.
A crise financeira tem suas origens no ano de 2003, quando o Banco Central Norte-americano, Federal Reserve, baixou as taxas de juros devido à crise das empresas “pontocom”, em 2001. Com os juros baixos, as empresas do setor imobiliário prosperaram e começaram a financiar imóveis para pessoas sem fontes de renda confiáveis. Esse tipo de empréstimo ficou conhecido como “subprime” porque seus clientes possuem rendimentos muito baixos, histórico de inadimplência e dificuldade em comprovar renda. Visando os lucros, os bancos e os gestores de fundos começaram a comprar os títulos “subprime”. Em 2006, o preço dos imóveis caiu e as taxas de juros aumentaram. Essa situação provocou o aumento da inadimplência que por sua vez gerou a crise no setor imobiliário. Em pouco tempo, a crise afetou outros setores da economia estadunidense e, posteriormente, a economia mundial.
Demissão em massa é o assunto que tem dominado as editorias de Economia dos principais meios de comunicação do país e gerado muita preocupação nos trabalhadores brasileiros.
A General Motors de São José dos Campos (SP) demitiu 744 funcionários, o banco HSBC cortou 100 empregados da lista de pagamentos na unidade de Curitiba, a Sadia, uma das maiores indústrias brasileiras do setor alimentício, anunciou 350 demissões em uma de suas fábricas, localizada na Vila Anastácio (SP). Esses são alguns dos muitos casos de demissões divulgados pela grande mídia. Segundo Reinaldo Gonçalves, professor do Instituto de Economia (IE), da UFRJ, a mídia brasileira tem tratado a questão da crise de forma adequada. “A crise financeira é grave e tem obtido a repercussão apropriada”, explica.
Na opinião do economista, os profissionais da área de comunicação exercem um importante papel nos períodos de crise. “É grande a importância dos profissionais da área. Questões de natureza técnica e ética estão sempre envolvidas. Naturalmente, os profissionais ficam, em muitos casos, limitados pelos interesses e valores dos proprietários e dos editores”, analisa Gonçalves.
No início da crise, o governo sustentava a idéia de que o Brasil estaria imune aos problemas gerados pelo abalo global devido ao acúmulo de reservas e foi duramente criticado pela imprensa. Para o docente, as críticas feitas pelos meios de comunicação são positivas.
–– A imprensa agiu de forma responsável frente a um governo marcado pela irresponsabilidade, principalmente, do presidente da República e de algumas autoridades da área econômica. Este é um pequeno exemplo da importância da democracia no Brasil onde as instituições são, de modo geral, fracas –– esclarece o professor.
A flexibilização do trabalho
A fim de evitar demissões, muitos empresários têm adotado medidas alternativas, como férias coletivas e redução da jornada de trabalho e salários. Gonçalves, porém, não vê a flexibilização do trabalho com bons olhos. “A flexibilização do mercado de trabalho é ruim para o trabalhador. Em curto prazo, pode aliviar a situação para aqueles que estão empregados. Mas, definitivamente, não é saída para a crise. Na realidade, ela aprofunda a crise via corte de jornada e de salários” pontuou.
A crise no Brasil
Sobre a situação do Brasil diante da crise, Gonçalves afirma que o país tem uma vulnerabilidade externa muito grande. Entre os fatores responsáveis por essa fragilidade da economia brasileira, o professor destaca a dependência da exportação de commodities cujo mercado internacional está em crise, a retirada de capital do país por parte dos investidores estrangeiros e a forte presença de empresas multinacionais, cerca de um quarto do PIB, fazendo com que a crise nas matrizes repercuta nas filiais brasileiras via redução dos investimentos e queda do emprego.
A fim de ilustrar como o Brasil está sendo afetado pelo abalo global, Gonçalves compara a economia a um trem. “O Brasil é um vagão de terceira classe na economia mundial. Portanto, as crises nos países desenvolvidos e, principalmente na locomotiva (Estados Unidos) são transmitidas internacionalmente e afetam em cheio o Brasil”.
Expectativas para 2009
Para muitos analistas, a posse de Barack Obama representa a esperança de recuperação da economia mundial. Gonçalves, no entanto, discorda desse posicionamento. “Sou cético em relação ao governo Obama. Não creio que representará mudanças significativas para o mundo. A força do establishment estadunidense é muito grande. Trocas de símbolos não são suficientes para provocar mudanças gerais. Tenho a impressão de que Obama é um conciliador nato”, declara o professor.
Segundo Gonçalves, 2009 não reserva surpresas muito agradáveis para a economia brasileira. “Essa crise está só no início. A hipótese é que a maior parte dos países do mundo sairá da crise antes do Brasil. Até 2012 não vejo quadro favorável para a economia brasileira. Grande parte desta trajetória medíocre é de responsabilidade do governo Lula, pela sua irresponsabilidade, que aprofunda o subdesenvolvimento brasileiro, inclusive, na esfera institucional”, conclui.