Edição 272 20 de outubro de 2009
Necessita apenas de sanção presidencial o projeto de lei que restringe a matrícula dupla em universidades públicas. Se aprovada, a medida impedirá que estudantes ingressem em dois cursos simultaneamente. Para alguns setores acadêmicos e estudiosos da Educação, a lei evitará a ocorrência de vagas ociosas e permitirá o acesso de um número maior de alunos às instituições de ensino superior. Na opinião de outros grupos, em especial das associações estudantis, o projeto não é capaz de solucionar a falta de vagas que, atualmente, atinge boa parte das universidades.
Para debater a questão, o Olhar Virtual conversou com Belkis Valdman, pró-reitora de Graduação (PR-1) da UFRJ. Valdman apoia a medida de restrição da matrícula dupla, argumentando que apenas cerca de 10% dos estudantes que cursam duas universidades simultaneamente conseguem conciliar ambas as atividades.
Olhar Virtual: O edital do concurso de acesso aos cursos de graduação da UFRJ de 2010 já determina que a matrícula dupla está proibida. Qual será o procedimento adotado pela universidade para verificar isso?
Belkis Valdman: O aluno, no ato da matrícula, assinará um termo no qual constará que ele não tem vínculo com outra universidade pública. Isso será checado. Se for constatado que ele tem outra matrícula ativa, o aluno terá um prazo de cinco dias para optar entre as universidades.
Olhar Virtual: Essa é a primeira vez que a UFRJ adota a medida?
Belkis Valdman: Oficialmente, este ano será a primeira vez. O Conselho de Ensino e Graduação (CEG) já emitiu resolução para que a proibição constasse no edital. Na verdade, essa sempre foi uma preocupação nossa. A comissão do Vestibular já vinha procurando meios de implementar a medida na UFRJ.
Olhar Virtual: Por que essa era uma preocupação?
Belkis Valdman: Como o ensino público deve ser o mais democrático possível, devemos dar oportunidade a todos. Menos de 10% dos alunos que mantêm matrículas duplas conseguem cursar as duas universidades. Geralmente, o estudante não assiste a um dos cursos, não consegue conciliar as atividades e acaba prendendo uma vaga. Ele abandona o curso e, muitas vezes, não se dá nem ao trabalho de trancar ou cancelar a matrícula. A proibição de matrícula dupla aumenta a chance de outros estudantes ingressarem no ensino superior.
Olhar Virtual: Como as universidades vão se articular para o controle da matrícula dupla?
Belkis Valdman: As instituições de ensino superior do Rio de Janeiro já entraram em acordo para ser realizado um controle combinado que gere uma lista com os alunos ingressantes no próximo período letivo. Ainda não foi decidido, porém, como esse processo será executado.
Olhar Virtual: Muitos alunos cursam duas universidades na tentativa de conhecer melhor os cursos e, então, decidir a carreira que desejam seguir.
Belkis Valdman: Eu acho que, individualmente, para um aluno, essa é uma saída, mas para os colegas que estão na fila de espera de uma vaga, que, muitas vezes, não entram na universidade por questão de décimos, não é. Antes de ingressar na escola, o aluno deve se informar, através de amigos, familiares e pela internet sobre os cursos. Ele pode se decidir antes e, assim, dar uma chance aos colegas.
Olhar Virtual: A tentativa de cursar duas universidades simultaneamente pode ser encarada como uma consequência da entrada precoce do jovem no ensino superior?
Belkis Valdman: Existem discussões sobre a entrada precoce. O jovem, hoje em dia, já dispõe de uma série de informações sobre cursos e carreiras, proporcionadas pelo acesso facilitado a tecnologias como a internet, por exemplo. Ele pode conhecer, previamente, o mercado de trabalho e o conteúdo do curso. Não é tão difícil ele se decidir.
Olhar Virtual: A lei que restringe a matrícula dupla resolve o problema de falta de vagas nas universidades públicas?
Belkis Valdman: Não. Vale ressaltar que a falta de vagas atinge determinados cursos onde a procura é maior, mas não todos. Não tenho números exatos que mostrem quantas vagas serão aproveitadas com a restrição da matrícula dupla, mas sabemos que será um número bom. A lei não resolve o problema, mas combinada com a mudança no mecanismo de acesso aos cursos de graduação, através do Novo Enem, promove certa democratização do ensino superior.