Edição 265 02 de setembro de 2009
A sociedade passa a viver cada vez mais entre redes sociais virtuais. Aplicativos como o Facebook, Twitter, Orkut e blogs prometem a democracia máxima, em um universo onde todos podem estar no mesmo patamar. Para Jesús Martin Barbero, no entanto, essa realidade é utópica. Em recente entrevista ao jornal Folha de São Paulo, o teórico espanhol, referência na pesquisa sobre Comunicação e Cultura, confessa não acreditar na democracia trazida pela internet e suas adjacências. “Nunca fomos nem seremos iguais”, afirma.
Essa discussão propõe, em primeiro lugar, entender o que seriam essas comunidades. Barbero, autor de Dos Meios às Mediações, acredita que “no conceito de comunidade há sempre a tentação de devolver-nos a certa relação não mediada, presencial. E a utopia da internet é que já não necessitamos ser representados, que estamos lá”. Para Raquel Paiva, professora e pesquisadora da Escola de Comunicação da UFRJ, “hoje todo mundo volta a falar de comunidade, tudo virou comunidade”. Mas, para ela, são “comunidades flutuantes, virtuais, imaginadas ou afetivas, que constituem e definem o real nos nossos dias”.
Classificar essas redes como sociais ou não é o ponto de partida do debate. Segundo Raquel, essas redes são sociais na medida em que um grupo social é entendido como agrupamento de indivíduos que se encontram relacionados. “É preciso enfatizar que a grande maioria dessas redes não existe apenas na virtualidade. Acho que a sociedade atual é atravessada pelas possibilidades do convívio real e virtual e aqueles que não vivenciarem isso irão ficando à parte”, ela garante. Já Barbero duvida: “Falamos em rede social, mas o que significa social aí? Apenas uma rede de muita gente. Não necessariamente em sociedade. O site é real, mas a maneira como nos relacionamos, como o usamos, é muito distinta. O Facebook não nos iguala. Nos põe em contato, mas nada mais”.
Educação como leme
“Temos acesso a tantas coisas e tantas línguas que já não sabemos o que queremos.” Essa fala do teórico reafirma o sentimento de desorientação que a internet traz. E essa discussão, sob seu ponto de vista, traz à tona o tema da educação como norteadora de todas as ações. “O problema para mim não é o que vão fazer os meios, mas o que fará o sistema educacional para formar pessoas com capacidade de serem interlocutoras desse entorno; não de um jornal, uma rádio, uma TV, mas desse entorno de informação em que tudo está mesclado”, avalia Barbero.
Sobre esse aspecto, a professora Raquel Paiva concorda: “O que tem se convencionado chamar por redes sociais não proporciona nada por si só, nem mesmo o sentimento de igualdade. E o que diferencia os acessos é exatamente o nível educacional. A potencialidade de todo esse aparato virtual será definida pela capacidade interpretativa que o indivíduo possui”.
Outra grande preocupação da pesquisadora se concentra na circulação descontrolada de informações no ambiente virtual e na recente decisão da não-exigência do diploma para jornalistas. “Quando eu falei de educação, não falei apenas de instrução, mas sim de conhecimento e, principalmente, de capacidade de leitura e interpretação crítica. Esses são os componentes fundamentais para a formação de uma pessoa que vai produzir informação. É um erro confundir geração de conteúdos com Jornalismo”, ela defende.
Maior mobilização política?
Os defensores das novas tecnologias afirmam que a internet democratiza a informação e tem forte poder de mobilização política por conseguir reunir grande número de pessoas/usuários em torno dos mesmos interesses. A eleição do presidente Barack Obama, nos Estados Unidos, foi um exemplo disso. Mas até onde isso é verdade? Assim como as redes têm forte poder de mobilização, elas também se desarticulam muito fácil, por conta da velocidade da informação no ambiente internet.
A crítica de Raquel Paiva reside justamente na falta de uma orientação informacional. “O fato de ter acesso a maior número de informações não nos faz mais mobilizados nem mais políticos. O que define efetivamente a qualidade dessa mobilização é a capacidade que temos de interpretar esses dados.” A vantagem para ela é que, a partir desses inúmeros flash-mob (mobilizações instantâneas), petições on-line etc., pode surgir uma forma “menos pasteurizada” de participação política.
Quanto ao tema de sua pesquisa sobre Comunicação Comunitária, Raquel considera essas novas redes sociais um fator positivo. Para ela, trata-se de um processo capaz de propiciar maior visibilidade de inúmeros grupos. “Há maior troca de informação de grupos afins que se encontram distantes territorialmente, por exemplo”, esclarece. Entretanto, assim como Barbero, a pesquisadora acredita que a representação física é indispensável. “A alteração da configuração do espaço público e todas as suas mediações (familiar, trabalho, religião, política, educacional etc.) é um processo que exige ação no real”, salienta.