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Edição 247      28 de abril de 2009


Ponto de Vista

O poder militar pela educação brasileira

Monike Mar - AgN/ PV


Falar em outros aspectos da ditadura militar no Brasil que não se refiram às duras e aterrorizantes formas de instalação do poder pode soar estranho, diante do senso comum de que foi, senão o pior, um dos piores períodos históricos vivenciado por brasileiros. É inegável que a fase foi de terror para muitos que sofreram perseguição, tortura, exílio, censura, desde o golpe de 1964. Porém, para “estabelecer a ordem do sistema”, havia a preocupação de desenvolver o campo educacional brasileiro. Algumas medidas deixaram marcas que fazem da atuação militar no Brasil uma estratégia que tem lá suas contribuições. Esse é o ponto de vista de estudiosos e pesquisadores participantes do seminário realizado no dia 15 de abril na Faculdade de Educação da UFRJ, “Os militares e a educação no Brasil”.

Durante a ditadura, a educação se autonomiza do campo religioso, possibilitando desde então a intermediação dos militares, o que acarretou no desenvolvimento educacional e na origem de bases desse campo tal qual conhecemos hoje. Já no século XIX houve institucionalização da escola no Arsenal de Guerra. A escolarização do exército proporcionou intensa preparação de professores nas províncias. Outro aspecto é o da racionalidade e precisão aplicadas nos cálculos que envolviam armamentos, o que caracterizava o ensino militar como propulsor da ciência moderna do ensino das novas elites. No século XX, até o final da década de 1930, a partir da análise da produção intelectual de militares, observa-se a formação do interesse no campo educacional como estratégia. Revistas e artigos sobre educação revelam a preocupação militar com a função educativa e organizacional das massas por meio de sua formação. A existência da disciplina Moral e Cívica e a campanha para o avanço brasileiro de defesa do ensino primário obrigatório são exemplos que reforçam essa ideia. Para falar um pouco da ditadura implantada depois do golpe de 64, o Olhar Virtual conversou com um dos palestrantes do seminário, Renato Lemos, professor do Departamento de História do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ (IFCS):

Olhar Virtual: O que na ditadura vai além da tortura e da censura?

Quando disse que podíamos ver mais que a violência da ditadura, não estava me referindo a aspectos “positivos”, mas a outros significados — para mim igualmente “negativos”.

Olhar Virtual: Quais significados?

Principalmente a modernização do capitalismo brasileiro, que foi feita à custa do arrocho salarial e da repressão legal e ilegal às reivindicações dos trabalhadores.

Olhar Virtual: A preocupação dos militares com a educação seria uma estratégia para estabilizar o sistema?

Sem dúvida, as soluções dadas pelo regime ditatorial às questões educacionais tinham essa motivação, entre outras.

Olhar Virtual: O que isso poderia influenciar na educação propriamente dita?

Tratava-se de esvaziar o potencial contestatório dos estudantes em geral, e isso se traduziu em medidas como o regime de créditos, que substituiu o de turmas até hoje.

Olhar Virtual: Quais são as continuidades da ditadura?

Principalmente no plano ideológico, dos valores mais gerais que organizam a vida social. Embora não os tenha criado do nada, a ditadura foi o meio como muitos valores se instalaram fortemente em vários setores da sociedade. A “razão tecnocrática” principalmente. Há também atores políticos que fazem a ponte entre a ditadura e a democracia atual, em papéis de destaque, como José Sarney, Delfim Neto, Marco Maciel e outros.

Olhar Virtual: Durante a palestra o senhor chegou a afirmar que “ditadura militar” é uma nomenclatura mistificadora. Por quê?

Porque o que tivemos no Brasil foi um regime político que, embora os militares constituíssem um elemento fundamental, não se baseava apenas nas Forças Armadas. Importantes setores do empresariado nacional e internacional foram agentes ativos do golpe de 1964 e do regime que então se iniciou. Seus representantes, diretos e indiretos, foram ministros e membros influentes de conselhos governamentais. O empresariado em geral se beneficiou, em termos de acumulação de capitais, da repressão política que marcou o regime.

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