Edição 241 17 de março de 2009
No estado laico brasileiro, vestígios do conservadorismo católico vêm roubando a cena nos noticiários. Como se já não bastassem as polêmicas geradas pelo abuso sexual sofrido pela enteada aos nove anos de idade e a realização de aborto para salvar sua vida ainda incapaz de manter uma gravidez de gêmeos, a Igreja Católica de Pernambuco mobilizou a população ao ser divulgada a excomunhão da mãe que autorizou o aborto, negligenciando uma justa punição à barbárie cometida pelo padrasto.
A atitude da Igreja está em debate em diversos veículos de comunicação que, segundo a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), apresentam erroneamente o fato da excomunhão. O arcebispo de Olinda e Pernambuco, Dom José Cardoso Sobrinho, em entrevista à Revista Época, no dia 12, explicou que apenas citou o Código de Direito Canônico, no qual a excomunhão é automática:
“Estão dizendo que Dom José excomungou, o que é totalmente errôneo. Não é verdade que eu excomunguei, pois significaria que eu teria aplicado a pena da excomunhão. Eu simplesmente citei uma lei da Igreja pela qual quem comete o aborto automaticamente já está excomungado. Está escrito no Código de Direito Canônico. No Direito Civil isso é impossível, pois nesse caso é aberto um processo e no final o juiz aplica a penalidade. Na Igreja há a possibilidade de aplicação de penalidades automáticas, dentre esses crimes está o do aborto. Em outras palavras, não fui eu que excomunguei ninguém, eu só lembrei esta lei da Igreja, que está em vigor desde o primeiro século da nossa Santa Igreja”, defende-se o arcebispo.
Excomungando ou não, a postura da Igreja que está sendo veiculada sobre o caso chocou fiéis e não fiéis: uma demonstração de que o mundo caminha em direção contrária ao conservadorismo católico de proibições do aborto, do uso de camisinha, da eutanásia, da homossexualidade e de sexo antes do casamento.
— Mesmo a excomunhão podendo ser assimilada ou não por uma pessoa, há de se considerar que existem aquelas que ainda se sentem atingidas. Se analisarmos o papado de Bento XVI, verificamos que a preocupação maior da Igreja Católica neste momento está ligada à necessidade de tornar os católicos mais fiéis à doutrina ortodoxa, não importando se os perdem com atitudes como essa — opina Ivo Lesbaupin, sociólogo professor da UFRJ e membro da Organização Não-Governamental ISER/Assessoria — Religião, Cidadania e Democracia.
Em contraposição à necessidade de modernização da Igreja Católica, que desde a entrada de João Paulo II tenta restaurar o conservadorismo depois do Concílio Vaticano II, são criadas igrejas com outras vertentes que atendem a nichos cada vez mais específicos. Ministérios neopentecostais, como a Bola de Neve Church, ou ainda aqueles com pastores assumidamente homossexuais ou adeptos da pornografia, são alguns exemplos de uma modernização que Lesbaupin encara como modismos:
— Não acredito que essas igrejas da nova era vão ter expansão, pois estão muito mais ligadas à moda. Ao meu ver, as outras igrejas tendem a evoluir mais nessas questões, como os anglicanos, que já estão aceitando mulheres no sacerdócio, por exemplo.