Edição 268 22 de setembro de 2009
O plenário do Senado aprovou na última terça-feira, dia 15 de setembro, nova emenda ao projeto de reforma eleitoral (PLC 141/09), definindo que é livre a manifestação política na internet, que agora poderá servir de campo para propaganda eleitoral de partidos durante as campanhas, sendo vedado o anonimato e assegurado o direito de resposta. A emenda permite que os internautas possam se posicionar contra ou a favor de qualquer candidato por meio de canais como o Twitter, ou Blogs e Orkut.
Antes, as campanhas eleitorais só eram permitidas nos sites oficiais dos candidatos. Com a emenda, todo e qualquer site da rede pode divulgar propaganda de alianças e candidatos. Além disso, os senadores tiraram da reforma o artigo que proibia a veiculação de propaganda política na internet desde 48 horas antes do pleito até 24 horas depois da eleição. Pelo texto aprovado no Senado, os candidatos podem fazer propaganda em seus sites oficiais, ou dos partidos, mesmo no dia da eleição. Debates online poderão ocorrer, desde que sigam as leis impostas para rádio e TV. A lei determina que os responsáveis pelos debates devem convidar pelo menos dois terços dos candidatos, desde que sejam filiados a partidos com mais de dez parlamentares eleitos para o Congresso Nacional.
Para opinar sobre a nova emenda, o Olhar Virtual entrevistou Manuel Sanches, professor do departamento de Ciência Política do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ (IFCS) e o professor do curso de Propaganda e Publicidade da Escola de Comunicação(ECO), Paulo Senra.
“Sou a favor da internet sem censura, assim como sou a favor de qualquer manifestação pública sem censura. Isto não significa que eu seja a favor de não haver limites. Muito pelo contrário. A calúnia, a injúria e a difamação são crimes, graves, e devem ser mantidos como tal. Assim, se alguém calunia, injuria ou difama alguém, seja por internet ou por qualquer outro meio de comunicação, comete crime e deve ser punido rigorosamente.
A questão, que está por trás da censura ou da Lei, é o fato de que a internet estar além dos limites territoriais da nação. Censurar a internet é uma ingenuidade. China, Cuba, Afeganistão e alguns outros países tentam sem sucesso, simplesmente porque qualquer pessoa que tenha acesso à rede, e à internet, terá acesso aos sites internacionais sobre os quais os Estados nacionais não têm soberania. Ou seja, para censurar a internet, é preciso que os Estados censurem todo e qualquer acesso à rede mundial e com isso percam todas as outras informações ou percam centenas de horas fiscalizando cada uma das mensagens, um trabalho inócuo. Quer dizer, o parlamento nacional liberou aquilo que já é livre, algo mais ou menos como permitir às pessoas que respirem.
Por outro lado, mesmo estando fora do território nacional, toda e qualquer calúnia, injúria ou difamação, continua sendo crime, e deve ser mantida como tal. Assim se alguém comete crime que tenha efeitos no território brasileiro, ainda que não possa ser preso ou julgado, continua sendo um criminoso e, tão logo ponha os pés no território nacional, deve ser preso e condenado, caso seja culpado.
Quer dizer, até então, o Senado e o Parlamento estão jogando para a platéia, liberando o que já livre e condenando o que já é condenável.
O êxito ou o fracasso dos debates eleitorais por internet dependerão exclusivamente da capacidade dos políticos em atrair ou não os seus eleitores. No caso da internet, para lembrar do MacLuhan, teórico das mass midia dos anos 1960, o meio não é a mensagem. Ao contrário, é a mensagem quem determina a eficácia da internet. Ou seja, se o político tem uma boa mensagem ele terá maior sucesso do que aquele cuja mensagem não atende ao público. Não depende da imagem nem do pó-de-arroz, mas tão somente da boa palavra.
Portanto, nas próximas eleições, e certamente no futuro mais distante, a internet terá um papel fundamental nos debates eleitorais e, consequentemente, um papel decisivo na democracia.
Não importa se o controle da internet é difícil. Como disse antes, a calúnia, a injúria e a difamação continuam sendo crimes ainda que não possam ser coibidos facilmente. Mesmo hoje, na mídia tradicional, imprensa, rádio ou televisão, é difícil punir alguém por esses crimes, mas eles são crimes. Controlar o crime não significa censurar a sociedade. O Estado deve continuar buscando formas de capturar e punir aqueles que comentem crimes e não impedir que a sociedade use os avanços tecnológicos que ela criou. O usuário não é idiota. Hoje mesmo existem milhares de textos que circulam pela internet, textos atribuídos a autores consagrados que, na verdade, são falsos e que servem para ofender pessoas e idéias. O usuário já sabe disto, da mesma forma como sabe que existem vírus e spams, que também são crimes. Estes vírus e spams, tanto quanto os textos falsos ou ofensivos, devem ser encontrados, denunciados e punidos. Compete ao Estado atuar.
Não apenas as redes vão usar a internet. Ainda há muito de espontaneidade nos efeitos da internet, se nós compreendermos a espontaneidade como um efeito cujas causas nós ainda não conhecemos. Os fenômenos de expansão, difusão, fidelidade, assim como o súbito desaparecimento da notícia da internet estão muito próximos dos fenômenos das modas, fatos que são muito pouco conhecidos dos psicólogos, sociólogos ou especialistas em marketing. O sucesso desses últimos se deve muito mais a sua arte do que a sua ciência.
A ciência política tem muito a aprender e a contribuir com os estudos de internet. O fato político está além da fofoca disseminada pelo twitter, mas pode ser contaminado por ela em curto prazo de tempo. Por isso, os políticos deverão estar atentos, especialmente para as notícias disseminadas nas vésperas das eleições. É preciso tomar cuidado não apenas com o que se diz, mas principalmente com o que é dito pelos outros.”
“A próxima eleição será uma experiência inédita, com as páginas de redes sociais e de mensagens instantâneas liberadas. Alguns candidatos, no atual momento, já se consideram bem votados e acompanhados na Internet e, no entanto, muitos sofrerão enormes frustrações. Não é um processo fácil angariar seguidores no mundo do twitter e dos blogs, principalmente. É necessário ter informação para tirar dali algo interessante, com conteúdo, e não apenas bobagens, como muitos ficam escrevendo.
É divertido assistir ao vídeo “Pedro, devolve meu chip” - com milhares de acessos no You Tube - uma vez, mas ninguém ficará vendo o tempo todo. Isto, contudo, é um evento e a eleição é um processo razoavelmente longo. São três meses de contato e muitos já o iniciarão a partir de agora. Ainda haverá muita discussão sobre o que pode ser feito, se a página deverá mudar, se terá que sair do ar dois dias antes da eleição e voltar posteriormente ou se continuará até o final. O Senado permitiu a realização de propagandas a partir de 5 de julho, mas alguns sites já existem. Isto não é fazer propaganda? Então, como serão regulamentadas estas situações?
A rede mundial de computadores ainda não possui uma modelagem que permita, como em jornal ou televisão, mensurar ou precisar exatamente qual é o tempo que se pode estipular. Há duas dificuldades em relação à propaganda on-line: a dificuldade em realizar uma medição e o relativo desconhecimento do que é o meio da Internet. A web é percebida, principalmente entre os políticos, como se fosse uma mídia comum, tal como a radiofônica, a televisiva e a impressa. Por tamanha dificuldade de entendê-la que apenas os candidatos à presidência da república poderão realizar publicidade paga na rede. Isto se dá, muito provavelmente, por não se saber exatamente como proceder.
A propaganda é, de fato, importante, possui relevância, mas não muda, efetivamente, a opinião das pessoas sobre quem será um bom candidato ou não. A utilização das redes sociais, dos contatos dentro da web serão muito mais importantes do que fazer uma propaganda propriamente dita – como um banner que aparece do nada, por exemplo. Ao questionar, principalmente aos jovens, se gostam da divulgação de produtos ou serviços quando usam o computador, a resposta que se obtém é que, de uma maneira geral, existe uma espécie de aversão ao processo publicitário. Como a rede apresenta um princípio de liberdade muito forte, a entrada de algo que obriga o usuário a parar o que está fazendo para esperar passar, incomoda mais que beneficia.