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Edição 257      07 de julho de 2009


Entrelinhas

Educação multicultural

Fernanda Turino

Valorizar a diversidade cultural e compreender a escola como uma organização multicultural é uma das propostas principais do livro Educação Multicultural – Teoria e Prática para Professores e Gestores em Educação, organizado pelas professoras Ana Canen, da Faculdade de Educação, e Angela Rocha dos Santos, decana do CCMN. Através de estudos de caso, o livro pretende mostrar como professores e gestores devem agir, propondo iniciativas que contemplem a diversidade cultural e assim façam uma “educação antirracista, plural e transformadora”. O Olhar Virtual conversou com Ana Canen.

Olhar Virtual: Como surgiu a ideia de fazer um livro para educadores?

Ana Canen: O livro, organizado por mim e por Angela Rocha dos Santos, surgiu como resultado de reflexões a partir da realização de um curso de formação continuada de gestores e professores da rede pública do Estado do Rio de Janeiro, em parceria entre a UFRJ e a Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro, em 2005. Foi uma experiência bem-sucedida, em que temas educacionais foram trabalhados em uma perspectiva de valorização da diversidade cultural das escolas, dos alunos e dos professores e gestores. Foram dinamizados com a preocupação de interligar a produção teórica a atividades práticas, construídas a partir dos saberes dos atores escolares. A ideia, portanto, de difundir tal experiência foi fruto do sucesso desta experiência e da vontade de avançar na reflexão multicultural em termos mais concretos, ligados ao chão da escola.

Olhar Virtual: De que forma ele pode ajudar esses profissionais?

Ana Canen: Levando-se em conta que a escola é marcada pela diversidade de raças, classes sociais, gêneros, etnias, crenças religiosas e outras marcas, para a qual professores e gestores devem se sentir preparados, de modo a contribuir efetivamente na construção da escola desafiadora de preconceitos e transformadora do fracasso escolar. Além do mais, devem estar seguros no domínio de temas educacionais relevantes para o cotidiano escolar. Assim, ao articular o multiculturalismo à abordagem desses temas, bem como ao propor atividades de pesquisa, estudos de caso e outras atividades práticas, o livro pode contribuir nessa direção.

Olhar Virtual: Que conceitos contidos nele podem ser considerados inovadores?

Ana Canen: O conceito de multiculturalismo é central no livro. O multiculturalismo propõe a compreensão dos atores escolares como plurais e das escolas como organizações multiculturais, que lidam com a diversidade e que devem estar preparadas para o diálogo com as diferenças. Não faz sentido concebermos uma escola voltada apenas a uma pequena parcela que domina a cultura letrada, deixando de dialogar com a pluralidade cultural que acorre a ela. Ao mesmo tempo, a originalidade do livro se dá à medida  que articulamos a visão multicultural com temas educacionais mais convencionais, como o currículo, a avaliação e o projeto político-pedagógico, por exemplo. Ilustramos como se poderia pensar em tais temas, trazendo exemplos, sugestões e buscando extrair vivências dos professores e gestores concretos que atuam nas escolas.

Olhar Virtual: Como os estudos de caso foram importantes para a realização do livro?

Ana Canen: Os estudos de caso foram importantes porque representam aspectos desafiadores da prática do professor e do gestor. A partir desses casos, são convidados a pensar sobre fatos reais que concernem ao seu cotidiano, agindo como pesquisadores em ação, de modo a proporem iniciativas que contemplem a diversidade cultural. Os estudos de caso permitem a articulação teoria-prática, questionando, ressignificando o multiculturalismo no contexto do “chão da escola”.

Olhar Virtual: De que maneira a perspectiva multicultural em Educação é abordada no livro?

Ana Canen: A perspectiva multicultural, que basicamente valoriza a diversidade cultural e compreende as escolas como organizações multiculturais, é articulada a temas mais convencionais na Educação, tais como: a função dos gestores educacionais, o currículo, a avaliação educacional, a construção do projeto político-pedagógico, as relações interpessoais na escola e tecnologias educacionais, dentre outros. Essa articulação torna o olhar multicultural relevante para as questões concretas da escola, não se limitando a conjecturas, mas partindo para formas de traduzi-lo, de forma prática, no cotidiano de professores e gestores educacionais.

Olhar Virtual: O filósofo Edgar Morin fala sobre a importância de uma visão multidisciplinar sobre a Educação. Como esse conceito pode ser empregado na prática?

Ana Canen: A perspectiva multicultural pode impregnar disciplinas isoladas, mas também projetos multi, inter e transdisciplinares.  No caso da escola, a temática das tecnologias educacionais, por exemplo, é trabalhada no livro desta forma, podendo ser explorada em projetos que abarcam várias áreas do conhecimento em prol de uma educação antirracista, plural e transformadora. Entretanto, a perspectiva multicultural também pode ser trabalhada para além da área educacional, efetivamente rompendo barreiras curriculares. Os profissionais têm de estar preparados para enfrentar um mundo cada vez mais plural e, para tal, a visão multicultural pode impregnar, em uma perspectiva multidisciplinar, vários campos de formação.

Olhar Virtual: Qual o papel da universidade na construção de uma educação de base mais sólida no país?

Ana Canen: A experiência que deu origem a este livro mostrou o potencial da universidade como instância que pode liderar movimentos de parceria com outras envolvidas na formação profissional, em sua dimensão de extensão e de pesquisa. O diálogo das pesquisas desenvolvidas com as culturas escolares traz uma perspectiva de construção conjunta de novas soluções para uma educação mais dinâmica, plural e transformadora. Isso faz da universidade espaço privilegiado para a formação continuada de profissionais. Ao mesmo tempo, também contribui para a formação de seus próprios estudantes em uma perspectiva de pesquisa-ação, sempre inacabada, sempre a ressignificar teorias à luz de práticas. Temos de aproveitar, cada vez mais, esse potencial, para podermos contribuir para a construção de uma educação multicultural, efetivamente comprometida com a transformação social. 

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