“A existência do Feminismo tornou-se mais sensível a detalhes a esse sexismo cotidiano que passa quase despercebido, de tanto parecer ‘normal’.” Com essa frase, Simone de Beauvoir, intelectual francesa de destaque nas décadas de 1960 e 1970, sintetizava a importância do movimento feminista para retirar a mulher do papel secundário que desempenhava na sociedade até meados do século XX.
Tendo como gancho essa preocupação, a Secretaria Especial de Políticas Públicas para Mulheres (SPM), o Fundo das Nações Unidas para a Mulher (Unifem) e o Instituto Patrícia Galvão organizaram, nos dias 6, 7 e 8 de novembro, a sexta edição do seminário “A mulher e a mídia”. A intenção das palestras, que reuniram pesquisadoras, intelectuais e ativistas de 24 estados brasileiros, foi justamente a de refletir propostas que pudessem integrar as representantes do sexo feminino à produção de serviços midiáticos.
Atentas à I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), a ser realizada em Brasília, de 14 a 17 de dezembro, com o tema “Comunicação: meios para a construção de direitos e de cidadania na era digital”, as palestrantes debateram a construção de políticas públicas na área de Comunicação que contemplem o olhar das mulheres. A ideia é reunir e encaminhar as propostas geradas pelas discussões à I Confecom. “As questões de gênero precisam ser incorporadas às políticas públicas de Comunicação”, destacou Jacira Melo, diretora do Instituto Patrícia Galvão.
Durante as palestras, alguns dados relevantes foram pontuados. Oona de Castro, jornalista e coordenadora do Instituto Overmundo, por exemplo, destacou que a maior parte dos cadastros das redes de relacionamento na Internet é efetuada por mulheres. “Podemos avançar na organização das mulheres neste ambiente de internet e usar as redes para o ativismo e mobilização”, afirmou.
Oona enfatizou ainda que não basta discutir a forma que a mídia representa a classe feminina. Para a jornalista, é imperioso que as mulheres passem a controlar e a participar ativamente daquilo que os meios de comunicação produzem. “Ainda que a representação da mulher seja importante, mais ainda é a participação dela na mídia. Nós não estamos sendo só representadas, mas estamos nos representando. Vamos fazer mídia e vamos para o ativismo na mídia”, conclamou.
Já a advogada Marília Maciel ressaltou a importância de a mulher se inserir nos espaços de construção de plataformas na rede, ambiente ainda predominantemente masculino. Para ela, as mulheres devem ser também mais incisivas nos debates acerca da convergência digital. “Quem está tratando de convergência não está preocupado com a questão de gênero. Ou entramos agora neste debate ou então vão decidir tudo por nós”, disse.
Outros desafios se delineiam quando o assunto é a participação das mulheres no processo de convergência digital, caracterizado pela tendência de utilização de uma única infraestrutura de tecnologia para prover serviços que, até há algumas décadas, requeriam equipamentos, canais de comunicação, protocolos e padrões independentes. Durante o debate, as palestrantes evidenciaram a necessidade de a classe feminina estar preparada para trabalhar com essa realidade. Construir websites acessíveis pelo celular e utilizar o SMS para mobilizar política foram algumas propostas apontadas.
Miriam Goldenberg, antropóloga do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS) da UFRJ, pontua que a produção midiática deve adotar um novo olhar sobre o feminino. Para a docente, os serviços de mídia deveriam apresentar diferentes alternativas para as mulheres, outros capitais a serem explorados — e não apenas o corpo e a sexualidade —, e mostrar tipos de mulheres que são felizes, mesmo quando fogem dos padrões hegemônicos. “Devemos fugir à visão preconceituosa sobre a mulher brasileira como objeto sexual, submissa, passiva, voltada para o lar e para a família, ou como complemento do homem”, ponderou.