Durante muitos anos, os Hospitais Universitários (HUs) foram relegados ao segundo plano pelo Ministério da Educação (MEC). Os recursos destinados pelo MEC eram incipientes para atender até necessidades cotidianas. O resultado disso foi um progressivo desgaste das atividades desempenhadas pelos hospitais. A falta de concurso público para preenchimento de vagas, por exemplo, levou muitas instituições a contratarem profissionais de saúde terceirizados extraquadro, utilizando recursos de custeio (reservados, entre outras coisas, para a compra de material hospitalar) para o pagamento de pessoal.
Com o intuito de modificar essa realidade e de dar maior transparência à execução orçamentária e financeira dos HUs, a secretaria de Planejamento e Orçamento do MEC publicou a Portaria nº4, de 29 de abril de 2008. Nela, fica estabelecido que os créditos orçamentários para OCC (outras despesas correntes e de capital) destinados aos hospitais de Ensino deverão ser empregados, única e exclusivamente, nessas instituições, sem passar antes pelas universidades das quais fazem parte.
Para o repasse direto ocorrer, no entanto, o MEC determinou que os HUs se transformassem em unidades orçamentárias. Ou seja, cada hospital de ensino deve implantar uma Unidade Gestora e Executora (UG).
Para atender à demanda do Ministério, a UFRJ pretende criar o Complexo Hospitalar de Saúde, estrutura administrativa que reúne os nove hospitais da universidade: Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, Hospital Escola São Francisco de Assis, Maternidade Escola, Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira, Instituto de Neurologia Deolindo Couto, Instituto de Psiquiatria, Instituto de Ginecologia, Instituto do Coração Edson Abdala Saad e Instituto de Doenças do Tórax.
Em vez de o MEC dedicar recursos para cada hospital separadamente, a UFRJ optou por instituir um órgão que terá a incumbência de receber as verbas do governo e repassá-las às unidades hospitalares. Na prática, existirão duas unidades orçamentárias na UFRJ: uma vinculada especificamente ao Complexo Hospitalar de Saúde e outra relacionada aos demais institutos, faculdades e escolas da universidade.
Em entrevista, Alexandre Cardoso, diretor do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF), e Marcelo Land, diretor do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG), comentam as mudanças advindas com a Portaria, confira.
O Complexo Hospitalar é uma superestrutura administrativa que vai funcionar para resolver alguns problemas comuns dos hospitais, tanto na área administrativa quanto nas áreas de planejamento e de negociação. Os hospitais, porém, vão preservar sua autonomia.
Com a criação do Complexo, o Ministério da Educação poderá conhecer mais a fundo os hospitais de ensino da UFRJ. Durante muito tempo, fomos considerados instituições problemáticas para a administração do MEC, porque os hospitais eram extremamente custosos. Não havia uma atenção especial para eles. Essa portaria é um esforço do MEC e das universidades de começar a dar uma solução para os nossos problemas. A criação da unidade orçamentária permite que os recursos de cada hospital sejam vistos com clareza. Num futuro próximo, poderemos saber quantas pessoas estão trabalhando nos hospitais, quais são os recursos e de onde eles vêm.
Temos que começar a discutir a questão dos hospitais universitários. Todos os problemas estão vindo à tona e essa é a hora de resolver, sob pena de os hospitais universitários brasileiros sucumbirem. Se não tivermos uma posição clara do valor que o Brasil dá para esses hospitais, vamos continuar no quadro em que vivemos nos últimos anos: falta de atenção que levou o sistema a ir, gradativamente, se deteriorando. Os hospitais precisam ter tranqüilidade e financiamento adequado para responder aos desafios que o país coloca, inclusive no setor econômico da Saúde, que, por ser um setor extremamente competitivo e gerador de emprego, precisa estar fortalecido.
O Complexo é o espaço onde esse debate pode ser feito. A melhora dos hospitais vai se converter, no fim, em melhorias para a população.
Em 2004, peritos do Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), do MEC e do Ministério da Saúde (MS) compareceram aos Hospitais de Ensino para fazer um levantamento de suas condições: verificaram, entre outras coisas, se as unidades produziam Ensino e Pesquisa e o número de atendimentos que realizavam diariamente. Dependendo da avaliação da comissão, o hospital era certificado junto ao Ministério da Saúde ou não. No parque de hospitais da UFRJ, só foram certificados o HUCFF, o IPPMG, o IPUB e a Maternidade Escola. Nesse sentido, a mudança no modelo de financiamento beneficia, principalmente, os hospitais de menor porte que não receberam certificação do MS. Muitas dessas unidades, até hoje, passam por dificuldades por estarem isoladas, mesmo que façam trabalhos muito interessantes.
A nova forma de financiamento pode promover o atendimento imediato das necessidades das unidades hospitalares. Encontramos problemas quando nossos créditos são repassados para a Reitoria, pois há dificuldade de identificar quais são os nossos créditos. Esse tempo — entre a identificação e o repasse — gera transtornos no dia-a-dia do hospital.
O Complexo Hospitalar deve ser ágil e evitar burocracias: não queremos uma estrutura apertada, burocrática, que repita o que já existe hoje. Se formos criar uma estrutura pesada, pouco ágil, que não atenda aos interesses da atividade fim, não avançaremos. É fundamental que nós trabalhemos efetivamente como uma rede, do ponto de vista acadêmico, inclusive, atendendo aos interesses da universidade, gerando Ensino, Pesquisa e Extensão. É para isso que existimos. Nós temos hospitais com perfis diferentes que podem se complementar, mas é importante que a gente estabeleça os critérios acadêmicos para que possamos trabalhar em conjunto.