O lançamento do software MecDaisy despertou curiosidade sobre a nova ferramenta que possibilita a produção de livros digitais falados para deficientes visuais. A tecnologia foi desenvolvida através de um projeto de parceria entre o Ministério da Educação (MEC) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
A proposta de implementação foi feita em setembro de 2007, com o objetivo de garantir o acesso de deficientes visuais aos materiais impressos. “O MecDaisy surgiu a partir de uma necessidade do MEC, que há muito tempo vinha distribuindo material didático em braille para pessoas com deficiência visual, e havia problemas envolvendo esse processo, especialmente porque a produção em braille é cara e feita em poucos lugares do Brasil”, explica José Antônio Borges, coordenador do projeto do Núcleo de Computação Eletrônica (NCE).
Segundo Borges, o principal motivo para o desenvolvimento da tecnologia foi a necessidade de encurtar o tempo da produção de materiais em braille. Essa redução seria feita através da transmissão digital da informação. “A ideia era que os editores pudessem enviar diretamente o texto final, e esse texto, já digitalizado, pudesse ser distribuído, mas só isso não era suficiente, porque o texto digital simples, para um cego, não tem a plasticidade do papel. Aí surgiu a ideia de utilizar um padrão internacional acessível (o Daisy) para que se pudesse garantir o acesso completo dos cegos com a mesma facilidade da produção em papel”, analisa.
A ferramenta apresenta recursos de navegabilidade simples e recebeu investimento de R$ 680 mil. Além disso, o MEC vai destinar R$ 180 mil a cada um dos 55 centros de produção do livro acessível presentes em todo o território nacional.
Conhecendo o Daisy
O Daisy (Digital Accessible Information System) é um padrão usado mundialmente para produção de livros acessíveis, os chamados livros digitais falados (Digital Talking Book – DTB). Na verdade, trata-se da representação de uma publicação impressa em uma plataforma multimídia, já que publicar um conteúdo em formato DTB permite não apenas a navegação em sua estrutura textual (através de avanços e recuos em capítulos, seções e páginas), como também sua reprodução em áudio, utilizando gravações ou tecnologias de conversão de texto em fala (processo de síntese).
O uso desse formato permite a leitura virtual de um livro através de sua audição, sendo fundamental para parcelas da população que não tinham acesso a livros em braille, pouco numerosos no país, devido aos custos elevados de sua produção. “O braille e o Daisy são totalmente diferentes; enquanto o braille é uma estrutura textual, com letras escritas na forma de marcas táteis, o MecDaisy consegue gerar braille a partir do texto que ele está lendo, possibilitando sua impressão em impressora braille”, explica Borges.
O processo se dá por meio do escaneamento do texto impresso com a leitura ótica de caracteres, na qual ocorre a tradução das letras para o formato digital e, em seguida, há três opções de saída para conteúdo gerado: através da transcrição para o braille, impressão ampliada ou produção do chamado livro digital falado, que conta com o uso de um sintetizador de voz.
O programa também permite que sejam feitas anotações e marcações de texto a partir de recursos simples como teclas de atalho ou do mouse, sendo possível a mudança de página. “O Daisy pode ser considerado uma convergência de mídias: a impressa e a sonora. O texto que é exibido na tela é transmitido também em áudio, de forma sincronizada, e tudo isso é controlado por uma estrutura feita em xml”, diz. O professor afirma que uma das exigências do MEC no momento de implementação do projeto foi a possibilidade de o programa ser compatível com os sistemas operacionais Linux e Windows.
Dos sinais às palavras
Os livros em formato Daisy podem ser ouvidos em dispositivos como CD players. A obra em áudio se torna disponível ao usuário através de CDs, DVDs ou mesmo downloads na internet.
Para que um livro seja convertido em áudio é preciso ter em mãos o texto original em formato eletrônico. “O livro poderá ser lido por um locutor famoso e depois ser distribuído na forma Daisy, que é um conjunto de arquivos: forma textual, áudio e arquivos de sincronização e indexação.”
A sincronização do áudio gravado com o texto na tela do computador permitirá que, por exemplo, um estudante cego “ouça” um livro e os que possuem baixa visão possam utilizar ampliadores de tela e alterar o tamanho da fonte, facilitando o processo de decodificação da mensagem visual.
Um futuro promissor
A distribuição do software é coordenada pelo MEC e o download pode ser feito no site do NCE. Para Antônio Borges, muitas expectativas envolvem o futuro do MecDaisy. Ele conta que até 2010, segundo determinação do MEC, os livros didáticos, distribuídos nas escolas públicas de todo o Brasil através do Plano Nacional do Livro Didático (PNLD), terão que ser produzidos também no formato Daisy ou vir acompanhados de um CD-ROM com a ferramenta.
Tal exigência implicará o aumento de custo para as editoras, que terão que se adequar à geração do material. Apesar disso, a adoção do sistema pode ser considerada um grande avanço para o país. “Se uma pessoa cega precisar de um livro, ele vai estar disponível em formato acessível. É a garantia de que o material em texto terá um equivalente em áudio para ser consumido pelos deficientes visuais”, conclui o pesquisador.