Edição 174 04 de setempro de 2007
Em 1937, dois anos antes de falecer, Sigmund Freud escreveu “Análise terminável ou interminável”, onde abordou a questão do limite do tratamento psicanalítico. Considerada por muitos estudiosos como o testamento científico do psiquiatra austríaco, essa obra causa ainda hoje furor entre os psicanalistas. Isso porque, no texto, Freud sugere que a Psicanálise, enquanto campo de tratamento, deve ter início, meio e fim, contrariando a hipótese de o paciente ficar permanentemente vinculado ao analista.
A pluralidade de leituras suscitadas por essa obra freudiana levou Theodor Lowenkron, coordenador do Laboratório de Psicopatologia e Psicanálise da UFRJ, a resgatar a discussão no livro “Psicanálise Interminável ou com fim possível?”, lançado na última sexta-feira (31), pela Editora Imago, no Forum de Ciência e Cultura (FCC/UFRJ).
No livro, o pesquisador utiliza a experiência realizada durante o tratamento de um paciente adulto que sofria de impotência sexual para debater a temporalidade da prática clínica da Psicanálise. Em entrevista para o Olhar Virtual, Lowenkron comentou as conclusões publicadas na narrativa. Confira.
Olhar Virtual: No decorrer do livro, o Sr. responde à pergunta contida no título da obra?
Theodor Lowenkron: Ao nomear o livro com o título “Psicanálise interminável ou com fim possível?”, quis refletir sobre o limite para o tratamento psicanalítico. A defesa principal da minha tese é de que a análise deve ter um fim, sendo um equívoco mantê-la interminável. O objetivo da análise não é dissipar todas as peculiaridades do caráter humano em benefício de uma “normalidade” esquemática nem tão pouco exigir que a pessoa que foi completamente “analisada” não sinta paixões nem desenvolva conflitos internos. Deve haver um limite do processo psicanalítico, como em qualquer outro processo terapêutico.
Olhar Virtual: Como identificar o momento certo de finalizar o tratamento psicanalítico de um paciente?
Theodor Lowenkron: O amor e o trabalho são as duas principais dimensões que permitem avaliar a saúde mental de um sujeito. Sendo assim, alguns indicadores que possibilitam ao psicanalista perceber a hora de terminar um tratamento são a superação significativa dos sintomas iniciais e também dos traços de caráter que prejudicavam a vida do sujeito; a normalização da vida sexual; a melhora na qualidade de interação desse indivíduo em suas relações familiares e sociais; e a diminuição da culpa e da angústia, embora não se pretenda que elas inexistam.
Olhar Virtual: No geral, quanto tempo é necessário para que o paciente atinja esses avanços?
Theodor Lowenkron: O tempo padrão é uma análise que dure de dois a seis anos, com uma freqüência semanal de três sessões, quando se utiliza o modelo francês, ou de cinco sessões, quando o método usado é o inglês.
Olhar Virtual: A noção de uma psicanálise limitada temporalmente interfere no processo de tratamento?
Theodor Lowenkron: Eu acho que é indispensável a consciência do fim. A consciência de que a vida tem um final é o que nos dá possibilidade de vivê-la mais intensamente. Quando trabalhamos com a idéia de que a análise irá terminar, a intensidade do trabalho analítico é maior, e o indivíduo tem a expectativa de que pode vir a solucionar os seus problemas e a adquirir condições de lidar sozinho com seus futuros conflitos.
Olhar Virtual: Quais seriam as desvantagens da psicanálise “interminável”?
Theodor Lowenkron: Para a condição das neuroses, ela é iatrogênica, ou seja, é prejudicial para o paciente, já que ele substitui a dependência dos pais pela dependência do analista. Isso vai de encontro à aspiração da análise que tem como objetivo instrumentalizar o indivíduo para que ele conquiste a liberdade. A psicanálise interminável é cerceadora dessa liberdade.