Edição 301 30 de junho de 2010
Ilustração:Diego Novaes |
Após o segundo jogo do Brasil na Copa do Mundo na África do Sul, o técnico da seleção brasileira, Dunga, dirigiu ofensas ao árbitro da partida, o francês Stéphane Lannoy, e ao principal jogador da seleção adversária, o marfinense Didier Drogba. Além deles, Alex Escobar, jornalista da Rede Globo, também foi alvo de palavras ofensivas, dessa vez sussurradas, após breve interrupção na entrevista coletiva.
A Rede Globo é uma das principais “parceiras” da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), já que investe milhões de reais nos direitos de transmissão de jogos da seleção e dos campeonatos organizados pela entidade esportiva. Ao ofender um profissional de uma empresa que tem laços tão fortes com seus “patrões”, Dunga corre o risco de estremecer as relações, tanto entre a CBF e a Globo, quanto sua possível permanência no cargo após a Copa.
Para Gabriel Collares, professor da Escola de Comunicação (ECO), o técnico deveria passar por um treinamento indicando pra saber como se portar diante da mídia. “Há jornalistas que pegam no pé e querem gerar notícia a todo custo, mas o técnico, depois de um profundo media training (como é denominada a técnica), saberia como agir”, afirma Collares.
O professor, que ministra a disciplina Assessoria de Imprensa para o curso de Jornalismo, acredita que a reação de Dunga vai além de uma atitude individual: “O técnico deveria ser repreendido, pois está ali representando o Brasil. Respostas rudes, palavrões e indelicadezas mancham a reputação da seleção e do país”, declara, lembrando a responsabilidade de Dunga e de toda a seleção. “O futebol vai além de mero esporte. É visto como representação da cultura brasileira e, portanto, identitária do Brasil para o mundo”, complementa.
Exclusividade e interesses comerciais
Diferentemente de outras copas recentes, a TV Globo não tem acesso exclusivo aos jogadores em determinadas ocasiões, como dentro do ônibus da delegação ou durante as folgas. Todos os integrantes estão autorizados por Dunga para falar com a imprensa apenas em entrevistas coletivas. “A exclusividade é perniciosa. O Dunga fez bem nessa situação específica, mas o problema foi a maneira como a coisa foi conduzida. Falta um plano de comunicação para a CBF”, analisa Collares.
O entrevistado lembra que a credibilidade é fundamental para a imprensa, logo, a empresa de mídia deve avaliar se é vantajoso perder autonomia para se ver à mercê dos interesses publicitários. “Um escândalo abalaria a empresa jornalística. Vale a pena destruir a reputação em nome de um contrato bem sucedido?”, indaga.
A função das assessorias de imprensa
Tratando o conflito como um exemplo para o relacionamento entre empresas, pode-se levantar a questão do comprometimento de uma organização de mídia com parceiros comerciais. “Há empresas que chegam ao ponto de oferecer um pacote para injetar verba publicitária em troca de matérias positivas”, revela Collares.
Ainda segundo o professor da ECO-UFRJ, as assessorias de imprensa devem fazer “o meio de campo” entre a imprensa e as organizações. “É uma relação delicada, mas a grande maioria das assessorias atua como mediadora, promovendo a instituição com pautas que interessam ao nicho de mercado daquela empresa jornalística”, afirma o professor.
As assessorias de imprensa, segundo Collares, “devem desenvolver suas ações tendo a ética, a transparência e o sentido do jornalismo como serviço de utilidade pública como foco”, conclui.