Edição 336 3 de maio de 2011
Ilustração: Diego Novaes |
O artigo 220 da Constituição Federal de 1988 deixa expresso: “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição”. Acontecimentos recentes na mídia brasileira geram um intenso debate sobre a liberdade de expressão. No programa Manhattan Connection (transmitido pela GNT), o jornalista Caio Blinder se referiu à Rainha Rania, da Jordânia, e a outras personalidades da realeza árabe como “piranhas”. Recentemente, o deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ) também se envolveu em polêmica ao ofender publicamente as comunidades LGBT e afro-brasileira durante entrevista ao programa CQC, da Band. Quais são os limites da liberdade de expressão? Como defini-los? A interpretação desse direito não parece tão clara quanto o artigo previsto na Carta de 1988.
Segundo Joaquim Welley Martins, professor de Ética no Jornalismo da Escola de Comunicação (ECO-UFRJ), trata-se de uma questão complexa: “A liberdade de manifestação no Brasil é livre, mas a utilização de termos pejorativos que possam implicar algum tipo de dano moral é uma questão ética e profissional. Entendo que ele (o jornalista Caio Blinder) usou a expressão (‘piranha’) de forma indevida até porque a pergunta que foi feita para ele não implicava nesse tipo de juízo de valor. Ele é livre para se manifestar, mas vai ter que assumir as possíveis consequências”, opina o professor.
Retratação
Martins explica que a retratação requer o envio de um pedido formal de desculpa, no caso específico para a Embaixada da Jordânia. O professor informa que somente a pessoa agredida pode recorrer à Justiça, entrando com uma ação de reparação de danos morais. O docente observa ainda que a emissora de televisão tem responsabilidade nesses casos. “Regras de ética da própria emissora têm que ser transmitidas antecipadamente. Tecnicamente, a direção do programa é que devia estabelecer essas regras. Apagar deslizes na edição seria falsear o que aconteceu. É melhor se retratar no próprio programa”, afirma Martins.
Mídia e bom senso
“No caso do Bolsonaro, houve outras implicações. Não era o ‘cidadão’ Jair Bolsonaro que estava falando, mas o deputado federal. Ele estava falando em nome do Legislativo, do qual ele faz parte”, especifica o professor de Ética, que atribuiu esse tipo de desrespeito à falta de educação. “Nessas situações entram em jogo o bom senso e a educação. Elas estão se tornando muito comuns por não haver mais um limite em relação à educação e sobre como exercitar esse direito de manifestação de pensamento”, frisa o especialista. De acordo com ele, o direito de cada um não pode esbarrar no do outro: “é uma questão de bom senso. Se você está falando com uma pessoa e se refere a ela de forma pejorativa, com termos jocosos, você está indo além do limite que a possibilidade de expressão lhe dá”.
Para o docente, a mídia brasileira favorece esse tipo de situação. “Acho que é uma pratica recorrente, por conta do sensacionalismo, para gerar discussão e vender. Há uma séria falta de políticas das próprias empresas de comunicação do Brasil”, conclui.