Edição 340 31 de maio de 2011
Amanda Gurgel, professora da rede pública de Educação do Rio Grande do Norte, recebeu atenção especial dos meios de comunicação nas últimas semanas. Em fala proferida na Assembléia Legislativa do Estado, deu voz à sua indignação, no último dia 10 de maio, em uma audiência pública sobre o cenário atual da Educação brasileira.
De maneira improvisada, porém firme, Amanda deixou claro que, embora as autoridades demandem calma, a situação exige solução urgente. O contracheque da professora, com o valor de R$ 930, foi utilizado como prova da impossibilidade de “se carregar um país nas costas recebendo tão pouco”. “Com este salário, os senhores não conseguiriam nem pagar a indumentária que usam para estar aqui” declarou, diante dos deputados estaduais potiguares. O discurso exemplifica as falhas do sistema educacional brasileiro em níveis gerais e poderia ser considerado a repetição de uma problemática social, já há tempos conhecida, porém silenciada pelo cansaço da exposição contínua e da ausência de medidas que visem a melhoria da Educação. Discute-se justamente se a fala de Amanda não viria a se tornar mais uma vítima da espetacularização e da consequente banalização do discurso proveniente da mídia.
O professor Roberto Leher, da Faculdade de Educação (FE) da UFRJ, analisa o real impacto da fala da professora. “O livro Ensaio sobre a cegueira, de José Saramago, é, de certo modo, uma metáfora sobre o neoliberalismo. A cegueira é por excesso de luz e, nesse sentido, a banalização pode enfraquecer a força da entrevista: a denúncia sobre o óbvio. A professora explicita o drama histórico da educação brasileira e, nesse sentido, por traduzir essa situação, a entrevista é muito positiva para a ‘desnaturalização’ do estado de emergência vivido pela educação pública. Ela mostra que o problema da escola tem rosto, nome, desfetichizando as avaliações que pouco avaliam, como os indicadores ditos de qualidade do Ideb (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) e outros. Gosto também do fato de que é uma professora da educação básica, militante da causa da educação, que tenha colocado o problema da educação pública na grande mídia”, reflete o docente.
Leher também analisa a questão da mídia como elemento que auxilia ou prejudica o desenvolvimento de melhorias na educação o professor. “A espetacularização esvazia a fala de seu conteúdo mais radical, profundo. Mas a ampla circulação da entrevista ganhou força a partir das chamadas mídias alternativas, sobretudo na internet. O que mostra que existem sujeitos sociais interessados no tema e que consideraram pertinente a denúncia da Amanda. Claro que, quando uma mensagem importante ganha visibilidade, temos uma vitória da democracia. Mas não podemos nos iludir quanto ao fato de que a grande imprensa não irá veicular matérias que afetem seus interesses. Não podemos ser ingênuos quanto a isso”, comenta.
Especula-se se há a possibilidade de uma mudança real na situação da Educação no Brasil. “Estamos no meio do processo de definição do novo Plano Nacional de Educação para a próxima década. Tudo vai depender do protagonismo dos educadores e dos movimentos sociais em prol da Educação Pública. As corporações estão organizadas e as seitas religiosas idem. Mas os educadores ainda não assumiram plenamente o caráter de urgência da luta pelo público”, finaliza Leher.