Edição 212 15 de julho de 2008
Como tornar a Física assunto corrente nas discussões entre amigos? Simples. Basta relacionar a ciência àquilo que é motivo de comoção nacional: o futebol. Essa foi a idéia que Gustavo Rubini, licenciado em Física pela UFRJ, em 2004, desenvolveu em seu projeto de conclusão de curso, intitulado A aerodinâmica da bola de futebol.
Sem dúvidas, o gol mais comentado há gerações nos bares e reuniões familiares foi o “que Pelé não fez” ocorrido na partida entre Brasil e Tchecoslováquia na Copa de 1970, sediada no México. Gustavo utilizou esse cenário para estimular a motivação pelo estudo da Física, já que ela consegue explicar o porquê de a bola não ter entrado naquela ocasião. Neste trabalho foram utilizados conceitos relacionados à aerodinâmica, como o arrasto (resistência do ar) e o de crise do arrasto, que segundo Gustavo Rubini, é fundamental para explicar a trajetória da bola na análise desse caso específico. Além da utilização do efeito Magnus (influência da rotação da bola em sua trajetória), conceitos básicos de gravitação, velocidade e aceleração também foram úteis para a explicação do fenômeno ocorrido na bola.
– Dois fenômenos aerodinâmicos são fundamentais para explicar a trajetória da bola: a crise do arrasto e o efeito Magnus. A crise do arrasto foi responsável por diminuir a resistência do ar no início da trajetória, fazendo com que a perda de velocidade da bola fosse menor do que o esperado. O efeito Magnus criou uma força de sustentação na bola, para cima, que permitiu que ela ficasse mais tempo no ar antes de tocar o chão. A combinação desses dois efeitos fez com que a bola pudesse chegar ao gol e quase fazer “o mais fantástico gol de todas as Copas passadas, presentes e futuras”, segundo Nelson Rodrigues – explicou Rubini, que, em março deste ano, terminou o Mestrado em Bioquímica Médica com ênfase na educação, gestão e difusão das biociências pela UFRJ.
Ele afirmou que a idéia desse trabalho surgiu durante as aulas do professor Carlos Eduardo Aguiar, na disciplina de Informática no Ensino de Ciências, quando o mesmo propôs uma atividade para a turma fazer simulações de diferentes trajetórias de projéteis. “Uma das nossas tarefas era comparar trajetórias no vácuo com trajetórias que incluíssem a resistência do ar. O professor Carlos Eduardo mencionou o efeito de ‘crise do arrasto’ como curiosidade, que não fazia parte da aula, mas eu me interessei, fiz uma simulação e mostrei a ele. A partir daí, comecei a me aprofundar no tema sob sua orientação”, revelou Gustavo.
Com intenção de tornar seu projeto mais didático e aproximá-lo dos leigos em Física, ele digitalizou o vídeo da famosa jogada de Pelé e separou as imagens quadro a quadro, o que segundo ele, foi realizado com o auxílio do Laboratório Didático do Instituto de Física (Ladif). Através de um programa de computador, escrito em linguagem Logo, foi possível obter a posição da bola em cada uma dessas imagens, o que permitiu a obtenção da velocidade inicial e final da trajetória. Posteriormente, desenvolveu junto ao seu orientador um programa, também em linguagem Logo, que, a partir das condições anteriormente obtidas, era capaz de variar diversos parâmetros relacionados à resistência do ar e verificar como cada um deles influenciava na trajetória da bola de futebol. O que, segundo ele, possibilitou encontrar a simulação mais próxima da trajetória real.
É freqüente ouvir dos locutores esportivos que o jogador fulano “pegou embaixo” da bola, em chutes em que a bola sobe demais e passa muito acima do gol. Gustavo chamou atenção em seu trabalho para essa característica de rotação da bola, nomeada backspin. Esse termo é bastante conhecido por tenistas, mas é incomum no linguajar do futebol. Para Gustavo, é esta a finalidade de seu trabalho, que, ao aplicar a Física geral ao futebol, paixão de 9 entre 10 brasileiros, busca ensiná-la e difundi-la, usando o dia-a-dia das pessoas como instrumento.