Edição 339 24 de maio de 2011
O escândalo envolvendo o agora ex-diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI) e possível candidato à presidência da França, Dominique Strauss-Kahn, foi um dos assuntos de maior destaque na mídia na última semana. Acusado de agressão sexual e tentativa de estupro contra uma camareira de um hotel em Nova Iorque, Strauss-Kahn aumenta o número de políticos protagonistas de escândalos sexuais. Assim como ele, faz parte da lista o primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi, denunciado no início deste ano por envolvimento com prostitutas, entre elas uma menor de idade.
Nos Estados Unidos, entre os últimos casos mais marcantes estão o do ex-governador de Nova Iorque, Eliot Spitzer, acusado de ligação com uma rede de prostituição, em 2008, e o do ex-presidente Bill Clinton, que teve um caso extraconjugal com uma estagiária da Casa Branca, em 1998.
Devido ao grande destaque dado pela mídia aos episódios e às repercussões dos mesmos sobre as autoridades e a sociedade, a maior parte dos envolvidos foi afastada de seus cargos, e isso acarretou grandes mudanças no cenário político mundial. No caso de Strauss-Kahn, a política francesa encontra-se em crise pela exposição e acusação do socialista com melhor chance de chegar à presidência do país, enquanto autoridades de diferentes nações discutem como será escolhido o seu sucessor no FMI.
Em meio a esses casos, a imprensa torna-se descobridora e investigadora de crimes e desvios de conduta de figuras públicas, mas esse papel é correto? A abordagem feita pelos meios de comunicação é adequada? Como fica a imagem desses políticos? E a ética nisso tudo? A população é devidamente informada sobre o que acontece?
Para Joaquim Welley, jornalista e advogado, e Marcelo Serpa, especialista em Marketing, ambos professores da Escola de Comunicação (ECO-UFRJ), em situações como essas a mídia cumpre sua função de informar a sociedade, mantê-la ciente do que tem o direito de saber. “O papel da imprensa é noticiar, alertar as pessoas sobre o que acontece no mundo”, afirmou Serpa. De acordo com Welley “um político é uma pessoa pública, então sua vida também é pública e gera notícia”.
O grande espaço que os casos ocupam nos jornais é, de acordo com os professores, condizente com a gravidade das denúncias. No entanto, alguns veículos podem utilizar o assunto para autopromoção, vendendo matérias sensacionalistas, pois “a notícia de escândalo tende a atrair um público maior”, disse Serpa. Welley também acredita que “o espetáculo vende, então, como em algumas empresas do meio jornalístico o aspecto comercial é mais forte do que o aspecto informacional, o que se faz é ir atrás do que a população quer. Se D. Maria I já dizia ‘dê pão e circo ao povo que ele está feliz’, então o circo está aí”. Ainda é possível dizer que a qualidade da notícia e o respeito às investigações das denúncias dependem do bom-senso da orientação do editor e do procedimento do repórter, como ambos concordam.
Em relação à população, os especialistas creem que ela deve distinguir até que ponto está sendo informada sobre o ocorrido ou sendo vítima de algum tipo de manipulação. Segundo eles, é preciso que leitores e espectadores procurem formar as próprias opiniões a partir de dados confiáveis e de diversas visões sobre o fato. Para isso, Welley sugere que o público “vá atrás de outras fontes de informação, procure na internet ou em canais que não sejam da imprensa, como órgãos oficiais que têm função fiscalizadora, por exemplo”.
Na opinião de Serpa, “a comunicação sempre apresenta várias versões sobre o acontecido: da vítima, do acusado, da imprensa, da política etc. E é a partir da análise de todas elas que eu vou formar minha própria opinião”.
Quanto à imagem dos políticos evolvidos nesses escândalos, como Strauss-Kahn, Marcelo Serpa analisa que “ela é um conjunto de instantâneos que ele vai colecionando a vida toda, com suas atitudes boas e ruins”. A partir do momento em que um fato negativo como esse é exposto ao público essa personalidade sofre um abalo, mas “é possível reverter a situação, fazendo um controle de danos. Para isso, é preciso analisar a repercussão do caso para traçar um estratégia que tente diminuir o problema”, afirmou o professor.
Ainda segundo ele, “o acusado pode fazer uma série de ações, seja por conta própria ou por orientação de um profissional de comunicação. Entre elas realizar um pronunciamento para imprensa ou, como no caso de Strauss-Kahn, alegar que não aconteceu crime nenhum, que foi tudo uma tentativa de envolvê-lo num escândalo para impedi-lo de concorrer à presidência da França. Esta atitude pode ser baseada em fatos verídicos ou pode já ser uma
estratégia de marketing para tentar melhorar a imagem do político”.
O professor também acredita que a mídia seja somente mais um dos fatores a serem avaliados para projetar uma retratação do político frente à população, pois cada segmento da sociedade tem seu ponto de vista e a imprensa é um deles. “Os veículos são um dos agentes que vão trabalhar a informação, vão divulgá-la. A mídia é parte do problema que será administrado. Por isso, deve-se fazer um levantamento de tudo que está sendo publicado para saber quais são as pautas positivas e negativas e, a partir daí, traçar as possíveis estratégias. É preciso ter um entendimento completo do quadro”, disse Serpa.
Em relação à ética dos políticos envolvidos, Joaquim Welley declara que vivemos uma crise, na qual “aqueles que são referências, geralmente, por estarem numa situação de poder diferenciada, acham que não precisam cumprir as mesmas regras que estabelecem para a população ou o que a lei determina”. Para ele, há tantos escândalos sexuais como o de Strauss-Kahn porque “existe a questão de o político acreditar que está acima da lei e que pode fazer qualquer coisa sem ser denunciado. Ele acha que, por causa do papel importante e da influência que tem, seus erros nunca chegarão ao conhecimento público”.
De acordo com o professor, “pessoas que exercem funções públicas, representam a sociedade ou uma parte dela, como Strauss-Kahn, devem ter uma conduta irrepreensível”. O jornalista e advogado acredita que o político, ao escolher essa função, deve saber que sua
integridade pessoal é imprescindível. “Se ele optou por exercer essa atividade, tem que pagar esse ônus, que é ter uma conduta totalmente fora de qualquer suspeita”, atestou Welley.
O especialista ainda defende que a mídia contribui para que o desfecho das denúncias seja positivo para a sociedade, pois “como a imprensa pressiona as autoridades responsáveis pelo caso e pela função cumprida pelo envolvido, atitudes mais efetivas são tomadas para que as investigações prossigam devidamente e o próprio acusado tenha que se posicionar e
explicar para a população o que aconteceu”.