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Edição 220      09 de setembro de 2008


Ponto de Vista

O olhar do outro

Aline Durães

imagem ponto de vistaQue o Brasil tem uma importância ímpar na América do Sul ninguém duvida. O que tem sido alvo de desconfianças nos últimos anos, no entanto, é a forma como ele exerce sua influência sobre os vizinhos. Episódios como o imbróglio, ocorrido no início desse ano, com o Paraguai, por conta das tarifas cobradas pelo governo brasileiro pela energia elétrica de Itaipu, evidenciam que algumas nações não vêem com bons olhos certas posturas brasileiras.

Para entender melhor como o Brasil é visto pelos demais países da América do Sul, região cada vez mais importante para o nosso comércio exterior, o Colégio Brasileiro de Altos Estudos da UFRJ vai organizar, entre os dias 22 e 25 de setembro, o seminário Brasil: um olhar sul-americano. Dividido em três etapas — inscrição de trabalhos, apresentação de artigos e apresentação pública das conclusões das discussões —, o evento contará com a participação de, pelo menos, um pesquisador de cada país sul-americano, além de estudiosos brasileiros, que pretendem analisar a percepção dos povos da região acerca do papel desempenhado pelo Brasil nos âmbitos social, econômico, científico e político dentro do continente.

Em entrevista ao Olhar Virtual, Adilson Oliveira, professor do IE responsável pelo evento, conta as motivações que o levaram a organizar o seminário e comenta alguns temas que serão debatidos durante as palestras. Confira.

Olhar Virtual: Como surgiu a idéia do evento Brasil: um olhar sul-americano?

Nos últimos anos, em particular a partir de meados da década passada, com a criação do Mercosul, o Brasil passou a ter mais relações comerciais com seus vizinhos. À medida que a gente começou a ter uma gama maior de atividades científicas, tecnológicas, econômicas e sociais com os demais países da América do Sul, notamos que a percepção deles sobre nós não era aquela que imaginávamos. Desse modo, é importante conhecer melhor o que eles pensam da gente, para não ficarmos com uma auto-imagem distante da realidade.

Foi então que tivemos a idéia de convidá-los a vir ao Brasil. A idéia é entender como eles nos percebem nas dimensões científica, tecnológica, cultural e econômica. Foi o desejo de compreender melhor o olhar externo sobre nós mesmos que motivou esse evento.

Olhar Virtual: Como o Brasil achava que era visto pelo restante da América do Sul?

Achávamos que o Brasil tinha interesses não-conflitantes com os nossos vizinhos. Mas, na prática, verificamos que há conflitos. Por exemplo, construímos o gasoduto com a Bolívia. Pensamos que iríamos ajudar esse país com essa iniciativa, mas os bolivianos acharam que os estávamos prejudicando. A mesma coisa está acontecendo agora com o Paraguai em relação a Itaipu. Apesar de não querermos prejudicar ou explorar ninguém, a gente percebe que existe um certo desconforto diante da forma pela qual estamos conduzindo as coisas.

Olhar Virtual: Os outros países acreditam que o Brasil seja imperialista?

Esse é um termo que não gosto, mas acho que muitas nações acham que o Brasil está fazendo o que outros países já fizeram. Eu não gostaria que o Brasil adotasse posturas imperialistas. Por isso é importante mostrar para essas nações que, em certos casos, elas têm uma visão equivocada de nós. Mas, para isso, em primeiro lugar, devemos ouvi-los. A população está crescendo, as trocas aumentarão e precisaremos trabalhar em conjunto. Nesse sentido, o diálogo é fundamental.

Olhar Virtual: O diálogo gera integração. Mas que outros mecanismos podem contribuir no processo com os demais países sul-americanos?

Acho que o governo brasileiro tem procurado criar importantes iniciativas de integração. A própria criação da Comunidade Sul-americana de Nações é um exemplo. Além disso, existe o esforço econômico do BNDES de financiar projetos de empresas brasileiras que atuam nessa região. Existe, ainda, o esforço de integração cultural: o Brasil tem aberto vagas em universidades para que pessoas desses países venham para cá.

Olhar Virtual: Por que a América do Sul e não a América Latina?

O nosso contato com os países da América Central e com o México é bem mais limitado. Não excluímos a possibilidade de conversar com esses países, mas acho que nosso primeiro esforço deve ser tentar compreender nossos vizinhos mais próximos e depois, então, ampliarmos para outras regiões.

Olhar Virtual: A primeira etapa do evento foi a inscrição de trabalhos. Há muitas pessoas estudando o Brasil na América do Sul?

Para a minha surpresa, não. Tem muitos pesquisadores nos EUA e na Europa, mas na região da América do Sul ainda são relativamente poucos. Alguns dos que convidamos, inclusive, acharam a iniciativa interessante porque, pela primeira vez, puderam pensar o Brasil. São pessoas que, embora já tenham circulado por aqui, não refletiam sobre o nosso país. Eles tinham uma visão superficial do Brasil. Por isso, estamos muito entusiasmados com o resultado. Acho que vai ser positivo, vamos ter uma boa recepção do público.

Olhar Virtual: Quais as perspectivas desse evento?

Queremos ajudar o Brasil a formular políticas externas favoráveis e também auxiliar na construção de um relacionamento positivo entre nosso país e seus vizinhos sul-americanos. Esse é, na minha opinião, um interesse do Brasil. O país quer ter um relacionamento positivo. Ele não quer vizinhos que nos olhem como se os estivéssemos prejudicando. Se eles nos percebem assim, existem duas possibilidades: a primeira é que nós devemos corrigir nossas políticas; a outra é que talvez não lhes estejamos mostrando, de fato, nossas reais intenções.

Olhar Virtual: Ao final do seminário Brasil: um olhar sul-americano, será lançado um livro. O senhor já tem idéia de como ele será organizado?

Esse livro reunirá artigos de todos os participantes. Nós pedimos, durante a primeira etapa do seminário, que cada participante escrevesse um paper, um artigo. Agora faremos as discussões. Das discussões sairão relatórios que vão gerar o livro. Esperamos que esse seminário suscite novas iniciativas. Um seminário não esgota o problema, mas abre o diálogo.

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