Edição 167 17 de julho de 2007
Que os contos de fadas não nasceram infantis, não é novidade para ninguém. Eles fazem parte de um longo processo de elaboração e reelaboração de mitos e lendas, fundamental à formação e à compreensão da mentalidade das crianças. Entretanto, muita gente ainda não tem a capacidade de perceber isso. Não visualiza que, um simples conto como, por exemplo, “A Chapeuzinho Vermelho”, traz consigo informações e explicações a respeito de um mundo que os adultos deveriam dar aos mais jovens.
Mas, seria mesmo a grande função das histórias infantis estabelecer guias para o comportamento, fornecendo disciplina, amor ao próximo, cordialidade e coragem, ao invés de, simplesmente, maquiar a realidade? As crianças ainda se interessam por esse tipo de literatura? Visando discutir essas questões e outras mais, o Olhar Virtual convidou a escritora Georgina Martins, que coordena a Sala Monteiro Lobato da Faculdade de Letras (FL/UFRJ).
Olhar Virtual: A senhora concorda que o conto infantil faz a criança entrar em contato com questões complexas de forma sutil?
Georgina Martins: Bruno Bettlheim, psicanalista que se dedicou a crianças com distúrbio de comportamento, foi, se não me engano, o primeiro a defender essa tese. Para ele, o conto de fada é capaz de colocar a criança diante de situações conflituosas como, por exemplo, os medos que ela enfrenta: o medo da morte, o medo do abandono e o medo do desconhecido. Essas narrativas enquanto divertem, ajudam a criança a entender e a organizar o seu interior, favorecendo, dessa forma, o desenvolvimento de sua personalidade, além de contribuir para o seu crescimento e amadurecimento.
Olhar Virtual: Hoje em dia, as crianças ainda se interessam por histórias infantis?
Georgina Martins: Não existe, em minha opinião, criança que não se interesse por ouvir histórias, pois o ato de contar e de ouvir é muito mágico. O homem conta e ouve histórias desde que está no mundo, sobretudo para compreender o universo.
Olhar Virtual: Existe alguma fórmula para se produzir esse tipo de literatura?
Georgina Martins: É preciso deixar claro que o conto de fada tradicional é produto da oralidade, logo não conhecemos seus autores, mas sim os principais compiladores, como os irmãos Grimm e Charles Perrault.
É comum na literatura contemporânea, alguns autores revisitarem e reescreverem esses contos. Portanto, não acredito que fórmulas específicas possam dar conta da qualidade dos mesmos.
Olhar Virtual: Na produção de um conto de fadas contemporâneo, que questões não poderiam ficar de fora?
Georgina Martins: Isso é muito pessoal, varia de autor para autor, mas, na minha opinião, o que não pode ficar de fora, não pode e não deve ser ignorado é a qualidade literária do que se produz.