Edição 204 20 de maio de 2008
Um adolescente do Ensino Médio entra num ônibus para voltar para casa. Lá, encontra alguns colegas de turma que começam a gritar: – Viadinho! Viadinho!
Acompanhado do irmão heterossexual, que desconhecia a sua orientação sexual na época, o jovem ficou tão envergonhado que não conseguia encarar ninguém, apenas olhava para o chão.
O episódio o marcou. Atualmente, aos 21 anos, estudante do 4º período de Composição Paisagística da Escola de Belas Artes (EBA/ UFRJ), Rodrigo Marques ainda se lembra de como foi difícil retornar para a escola depois de ser desmerecido na frente de um familiar.
Violências como esta são muito comuns no ambiente escolar. Foi pensando nisso que o projeto Diversidade Sexual na Escola, integrado ao programa Papo Cabeça, oferece, pelo segundo ano consecutivo, nos meses de junho a setembro, o curso voltado, prioritariamente, para gestores e professores. Alexandre Bortolini, coordenador do projeto, explica:
– O curso é longo, tem 60 horas de duração e é financiado pelo MEC. A idéia é instrumentalizar esses profissionais da educação para lidarem com a diversidade sexual dentro da escola, trabalhando e discutindo essa temática, não só em sala de aula, mas na estrutura da escola mesmo, nas concepções ali construídas.
As aulas são ministradas por professores da UFRJ e também por representantes de outras instituições e líderes dos principais movimentos sociais no campo da diversidade sexual, como o Arco-íris, dos gays; o Delas, das lésbicas; e o ASTRA, dos travestis e transexuais.
Todos os participantes, ao final do curso, devem realizar um trabalho, uma apresentação propositiva de ação em um contexto específico que pode ser, por exemplo, em escolas ou faculdades, a partir de tudo que aprenderam e discutiram.
Oficinas
Além do curso, o projeto realiza, desde 2005, oficinas de sensibilização com a equipe de uma determinada escola. A própria instituição solicita essas oficinas, de quatro horas de duração, que visam o debate de conceitos, de visões e de idéias sobre a diversidade sexual. O foco dessas oficinas são as escolas públicas, diferentemente dos cursos, que também são abertos a profissionais das instituições particulares. De acordo com Bortolini, até hoje, não houve procura por parte de instituições privadas para as oficinas.
– A maioria das escolas particulares funciona como uma empresa e não gasta tempo e dinheiro com isso. Imagino que capacitar professores para lidar com a diversidade sexual não seja uma preocupação de grande parte delas. A escola pública já tem uma cultura muito maior nesse sentido – opina.
Os professores e a escola
Segundo Alexandre, as escolas passam por algumas dificuldades no enfrentamento do assunto. As dúvidas, no entanto, devem ser sanadas, principalmente no que diz respeito ao acolhimento de todos os alunos que se declaram abertamente gays, lésbicas, travestis ou transexuais. A negação da violência homofóbica existente, considerada, muitas vezes, uma brincadeira por professores, e forma de lidar com o tema da sexualidade como um todo também devem ser debatidas.
– O que sinto nas escolas é uma ânsia muito grande por uma certeza, por uma definição, por um certo e um errado que, na verdade, não existem. Essa temática deve ser discutida. Talvez normas, condutas e práticas devam ser revistas.
Como coordenador do projeto, ele conta como alguns esclarecimentos, no que tange à maneira de agir com um aluno homossexual ou saber de sua orientação sexual, por exemplo, são feitos:
– Na verdade, destacamos que o único jeito de um professor saber se um aluno é homossexual é se este lhe contar, porque, no mais, ele estaria julgando o estudante por estereótipo de gêneros e comportamento. Uma frase que sempre falamos para os professores nas oficinas é “com quem o seu aluno faz sexo ou não faz não é problema seu”. Agora, qualquer situação de discriminação e violência dentro da escola, seja qual for, é sim problema da escola e daquele educador.
Preconceito
Os casos de discriminação se estendem desde a agressão mais simples até casos de travestis que já foram mortas ou tiveram os membros amputados. Alexandre cita um dado de 2007, alarmante, sobre a discriminação sexual no Brasil: o país é a nação não-islâmica que registra o maior número de assassinatos de homossexuais no mundo.
– A gente só perdia para os países islâmicos – lamenta.