Edição 231 25 de novembro de 2008
Nos dias 12 e 13 de novembro, o Núcleo Interdisciplinar de Estudos Carnavalescos da UFRJ realizou o seminário Carnaval: perspectivas plurais. O encontro reuniu, no salão Azul da Reitoria, pesquisadores e convidados para um amplo debate sobre a importância do fenômeno carnavalesco na constituição da identidade brasileira.
Em uma das mesas redondas do evento, intitulada O Carnaval e as perspectivas midiáticas, Haroldo Costa, membro do Conselho Estadual de Cultura (CEC/RJ) e comentarista de carnaval; Eugênio Leal, radialista da Rádio Tupi; e Marcelo O’Reilly, criador do site Academia do Samba, traçaram um panorama da história da cobertura dos festejos na imprensa, desde o início do século XX até os dias atuais.
Haroldo Costa lembrou que o carnaval, por ser uma manifestação popular, sempre recebeu atenção especial da mídia, embora cada meio de comunicação optasse por um enfoque específico. Enquanto impressos como Jornal do Brasil, Gazeta do Rio de Janeiro, Correio da Manhã e A Noite dedicavam espaço até para os preparativos da folia, o rádio fazia uma cobertura mais pontual, divulgando apenas alguns acontecimentos, e a televisão preferia dar destaque aos bailes freqüentados pela alta sociedade.
Segundo o comentarista, a mídia teve papel fundamental para a inserção do carnaval no imaginário popular brasileiro. Foi a extinta TVE a responsável por fazer o telespectador compreender os festejos de maneira mais ampla, ao ter sido a pioneira na transmissão integral do carnaval, desde o sábado até a madrugada de terça-feira. “Isso foi um divisor de águas. A partir daí, os anunciantes perceberam a audiência e passaram a investir em propaganda. A mídia cresceu muito devido ao carnaval”, contou. Apesar de reconhecer que a festa também deve parte de seu sucesso à imprensa, Haroldo criticou a atenção exacerbada dada às celebridades que participam dos desfiles das escolas de samba.
— É frustrante para quem realmente gosta de carnaval, porque os personagens principais, como as baianas e os ritmistas, são colocados de lado. Mas, claro, a cobertura da mídia é importante. O carnaval é tão relevante para a vida cultural da cidade que seria um furo mercadológico, de transmissão e divulgação não cobri-lo — afirmou.
O som do carnaval
Se a televisão estimulou o desenvolvimento estético, o rádio contribuiu para a massificação da música de carnaval e para a criação de uma identidade nacional para o estilo. Para Eugênio Leal, o lançamento da TV em cores no Brasil revolucionou a forma como os carnavalescos compunham o desfile. A valorização do visual provocou, no entanto, o enfraquecimento da musicalidade como manifestação popular. “O carnaval passou a ser percebido pela alegoria e não mais pelo verso. Como conseqüência, o rádio, por não apresentar recursos de imagem, acabou perdendo espaço neste tipo de cobertura”, lamentou.
O radialista acredita que, hoje, as escolas de samba estão se distanciando cada vez mais da população média, por haver interesse em transformar o carnaval numa espécie de “negócio para estimular o turismo”. “O carnaval é uma festa popular na qual o povo produz cultura ou é um espetáculo que queremos mostrar para o mundo?”, questionou. Segundo Eugênio, a mercadologização da folia afeta, inclusive, a forma de transmissão, que privilegia as grandes emissoras de televisão.
— As rádios têm direito apenas a cabines na concentração do Sambódromo, de onde quase não é possível ver o desfile. Por isso, nossa prioridade é falar sobre quem efetivamente faz o carnaval, porque são eles que interessam ao público do rádio. Até mesmo porque esta mídia, por ser a mais barata, é ainda a mais popular, consegue atingir as classes C, D e E — enfatizou o radialista, acrescentando que o carnaval sobrevive devido àqueles que insistem em preservar sua memória.
Mantendo as tradições
Apaixonado pelos festejos carnavalescos, Marcelo O’Reilly criou, por hobby, o site Academia do Samba (http://academiadosamba.com.br/). A página reúne artigos, monografias, discografias e informações sobre desfiles e premiações passadas, que servem de banco de dados para pesquisas sobre carnaval. Tudo para manter viva a tradição da festa.
De acordo com Marcelo, que mantém sozinho o site, os portais que se dedicam a divulgar uma visão independente e não-espetacularizada do carnaval, assim como as rádios, são tratados como “veículos de segunda categoria” e impedidos de fazer a cobertura completa dos desfiles.
— Infelizmente, as escolas de samba ainda não reconheceram o poder da Internet. É difícil conseguir informações factuais sobre os enredos, por exemplo, porque as agremiações não fornecem este tipo de dado para sites. Para mim, informação guardada é informação perdida. Por isso, quem tiver mais, passe para mim que eu não vou guardar — brincou.