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Edição 217      19 de agosto de 2008


De Olho na Mídia

Liberdade sem destaque

Priscilla Prestes - AgN/CT

imagem ponto de vista

Neste ano, comemoram-se os 40 anos de 1968. Não são poucos os encartes em jornais ou os cadernos e especiais que celebram esse aniversário. A grande mídia recria e ambienta esse ano que ficou conhecido pela impactante força da generalizada insatisfação juvenil. Resta saber se esse esforço é capaz de destacar o real objeto de reivindicação daquela geração: a liberdade.

“Maio de 68” disseminou a luta por diretos políticos, contestou a Guerra Fria, foi o precursor de embates feministas e liberais, fez a sociedade questionar os padrões vigentes. A comemoração de episódios como esse reflete não só sua relevância histórica, como também o poder de contestação que lhe é atribuído. No entanto, celebrá-lo sem senso crítico, sem discutir seu contexto, analisar o cenário sócio-político no qual estava inserido, é transformar a versão mais importante que o próprio fato, é traçar uma releitura, porém sem os valores da ação inicial.

Ronaldo Lima Lins, diretor da Faculdade de Letras (FL) da UFRJ, classifica “Maio de 68” como um protesto estudantil, em certo ponto, mal fundamentado. Segundo ele, os estudantes queriam algo, mas não sabiam exatamente como formular esse desejo. No entanto, eles formulavam claramente, do ponto de vista filosófico, a necessidade de liberdade.

O movimento que começou na França e que se irradiou para diversos países no mundo, teve sua origem com a reclamação da juventude pela demissão do diretor de uma cinemateca. Em seguida, a situação se acirrou, transformou-se numa grande causa estudantil, que mais tarde englobaria outras camadas sociais. Seu ponto de partida foi a forte presença de uma juventude em expansão que queria cursar o ensino superior. O ambiente de revolta foi tão intenso que abalou as estruturas do governo. Os sujeitos participantes dessa tensão não tinham uma teoria dos fatos presentes, até mesmo porque não planejaram este arranjo. Esta necessidade de teorização surgiria depois, decorrente de algumas lideranças que seguiram um viés conservador.

– Desse episódio, o que ficou, fundamentalmente, foi a idéia de liberdade, com a qual não se soube muito bem lidar, nem conduzir. Ainda hoje, não sabemos muito bem o que fazer com esse lema. Fraternidade é um lema que desapareceu. Igualdade parece ter sido uma experiência fracassada. Da Revolução Francesa restou o ideal de liberdade, hoje, muito relativa e relativizada pelas circunstâncias econômicas. Tem-se que economia foi criada pelo homem, no entanto, ela o comanda – criticou Ronaldo.

Para o diretor, a mídia não está ocupada em discutir a liberdade – objeto de luta –, “ela assinalou o evento em ‘Maio de 68’ como se estivesse num calendário de comemoração, mas não aprofundou o debate”.

Discutir vivências anteriores possibilita que os cidadãos se tornem atores sociais de seu tempo, tira-os da posição de meros espectadores. Segundo Lins, atualmente, temos uma sociedade que necessita falar novamente da liberdade, devido à atual falsa impressão de liberdade. Ele argumenta que, na prática, as injunções sociais e a opressão são ferozes e que o debate é um pontapé inicial para a mudança, partida da ação. “Criticar é questionar onde pusemos o sonho, a liberdade e a ação”, argumentou.

Ronaldo Lins chamou atenção para uma nova geração estudantil que está disposta a discutir política, à militância política, a balançar as estruturas do sistema constituído. Segundo ele, além de ser saudável, é uma demonstração de apego à liberdade.

– Acredito que tem havido sintomas interessantes do movimento estudantil. Por exemplo, o reitor da Universidade de Brasília, que comprou uma lixeira por mil reais, só foi removido graças ao movimento estudantil. Dentro do muro da universidade eles fizeram uma importante revolução. Ainda mais no Brasil, onde a corrupção é a questão da ordem do dia. Vale lembrar que, na UFRJ, os alunos vêm mostrando vitalidade e espírito crítico. Na FL, foi a união e a organização dos alunos que retirou um permissionário do espaço de alimentação que ocupava precariamente, pois o mesmo, além de servir comida ruim e cara para o padrão econômico dos alunos, ainda mantinha a locação em péssimas condições de higiene – exemplificou.

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