Edição 355 13 de setembro de 2011
Há dez anos, o mundo assistiu perplexo ao “11 de setembro”. O sequestro de quatro aviões comerciais por membros de uma organização extremista do Oriente Médio, a Al-Qaeda, e a colisão de três deles contra o Pentágono e as torres gêmeas do World Trade Center (WTC) deixaram cerca de três mil mortos e colocaram os Estados Unidos, maior potência mundial contemporânea, em uma posição de fragilidade até então inimaginável. Em resposta ao acontecido, o presidente vigente, George W. Bush, declarou guerra ao terrorismo e iniciou a caça a Osama Bin Laden, principal articulador do atentado.
Uma década depois, o que mudou? O que aconteceu na época e acontece agora? Como vivem os americanos hoje? Os outros países também temem atentados terroristas? Para o professor Arthur Bernardes do Amaral, professor universitário e pesquisador do Grupo de Acompanhamento e Análise do Terrorismo Internacional do Laboratório de Estudos do Tempo Presente da UFRJ (Tempo), o “11 de setembro” foi um grande marco no governo Bush, que não soube lidar com a nova ameaça. “Bush intensificou o ‘unilateralismo’ estadunidense, reforçou a ideia de que os EUA são o centro do sistema e modificou os panoramas da política externa”, disse o especialista.
Segundo o professor, “o então presidente americano colocou o mundo contra a parede. Ao declarar uma guerra ao terrorismo de duração indefinida, foi feita uma grande pressão sobre as demais nações para que todas tomassem posições. O mundo se dividiria entre Estados Unidos e aliados contra os outros e os terroristas”. Como consequência das políticas de “unilateralismo” latente exercidas pelo governo Bush, outros países perceberam que tais medidas eram mais prejudiciais do que benéficas para o mundo. “O ‘multilateralismo’ passou a ser visto como forma de maior segurança para o sistema global. A ideia de que os objetivos e temores dos EUA deveriam ser incorporados por todos os Estados já não era mais tão bem aceita”, disse Amaral. O pesquisador afirmou ainda que, nesse contexto, houve grande perda da popularidade estadunidense pelo mundo, bem como insatisfação com a atuação de Bush. “Foi nessa fase que surgiram ideais de ‘antiamericanismo’- fortemente presentes na América do Sul -, que disseminam a aversão aos EUA. Além disso, o presidente George W. Bush, que havia iniciado seu mandato com o maior apoio popular da história americana, acabou visto como um dos piores governantes que o país já teve.”
Em relação ao que os atentados acarretaram diretamente para outros países, Arthur Bernardes do Amaral destacou que, mesmo depois do choque de ver um país tão poderoso em situação vulnerável, “poucas nações passaram a tratar o terrorismo como maior preocupação. Na época dos ataques, foram os Estados Unidos que forçaram esse medo para todo o mundo. No entanto, o que gerou, de fato, o episódio do ‘11 de setembro’ foi a instalação de bases militares estadunidenses na Arábia Saudita, interferindo na política interna e nos costumes do país. Sendo assim, o caso dizia respeito somente à relação dos EUA com o Oriente Médio”. Contudo, Amaral ressaltou que episódios como o atentado ao metrô de Madri, na Espanha, em 2004, “estenderam a preocupação com o terrorismo para a Europa. Houve mudanças nas políticas externas e de proteção desses países, mas não na mesma dimensão de como ocorreu nos EUA, justamente devido ao fato de os americanos serem os principais alvos e não os europeus”. Para o professor, o caso de Madri pode também estar ligado à ideia de visibilidade buscada pelos grupos terroristas, em relação à qual a mídia tem papel fundamental. “Essas organizações extremistas querem aparecer. Por isso planejam as ações em duas partes: uma para atrair a atenção e outra para mostrar a ação de fato. Como exemplo, podemos citar os dois aviões que atingiram as torres gêmeas: um colidiu primeiro para atrair a mídia, enquanto o outro bateu contra a segunda torre sob os olhos do mundo inteiro”, explicou o pesquisador.
Hoje, o que permaneceu do dia 11 de setembro de 2001 para os EUA foi o medo ainda presente entre a população, mas a preocupação com o terrorismo foi substituída pela preocupação com problemas mais recentes que afetam diretamente a vida dos estadunidenses, como a crise econômica de 2008. “Tenho amigos que moram nos Estados Unidos e dizem que não é possível ter tranquilidade ao estar em locais onde há multidões ou grande fluxo de pessoas. O medo passou a fazer parte da rotina, o que é compreensível. Desde 1812/14 os EUA não passavam por situações de ameaças ao território nacional, fazendo dos atentados um grande trauma. Porém, já se passaram dez anos e outras complicações vão se mostrando mais importantes”, afirmou o especialista. Para ele, o atual presidente Barack Obama tem papel fundamental nessa substituição de objetivo, já que “reflete em suas propostas e atitudes a ideia de reverter a visão negativa que o mundo passou a ter dos EUA desde o governo Bush. O foco apresentado agora é estabelecer uma boa relação com os outros países e pensar no reforço da imagem hegemônica americana”.
No Brasil, ainda que os atentados ao WTC não tenham colocado o terrorismo em posição de ameaça nacional, como apontou Arthur Bernardes do Amaral, atualmente, o governo precisa lidar com a ameaça de maneira direta, devido aos megaeventos que serão realizados no país e atrairão a presença e a atenção de pessoas do mundo inteiro. “Os Estados Unidos se tornaram uma vítima justamente por serem uma potência. O Brasil não tinha semelhante papel de destaque no cenário mundial, portanto não era alvo em potencial. Mas agora é preciso ter um olhar diferente sobre a questão, pois vamos sediar a “Copa do Mundo de 2014” e as “Olimpíadas de 2016”. Durante esses eventos, além de estarem presentes atletas e turistas das mais diferentes nacionalidades, todos os olhos estarão voltados para cá. Sendo assim, o governo brasileiro já está tomando providências para que, mesmo com nossas limitações de recursos, seja organizada a maior proteção possível. Um exemplo desse processo é a transferência da sede do BOPE (Batalhão de Operações Policias Especiais) de Laranjeiras para o Complexo da Maré, onde as tropas estarão próximas às principais vias de acesso da cidade, como as Linhas Vermelha e Amarela. Tudo será feito para que haja forte prevenção aliada à melhor preparação para um caso de combate”, concluiu o professor.
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