Na semana passada, a visita de George W. Bush, Presidente dos EUA, ao Brasil para assinar um memorando de entendimento entre os dois países motivou não só protestos da população brasileira, como também especulações a respeito da real intenção da passagem do dirigente norte-americano pelo território brasileiro.
A versão oficial apregoou que o propósito final da visita foi mesmo o estabelecimento de um acordo de cooperação tecnológica entre Brasil e EUA para a pesquisa e o desenvolvimento do etanol, álcool etílico a ser utilizado como combustível. A parceria seria então, nesse sentido, mais um esforço no caminho da substituição dos combustíveis fósseis – cujo maior exemplo é o petróleo – por fontes de energias mais baratas e menos poluentes.
Não faltaram aqueles que, em contrapartida, visualizassem no acordo a tentativa de Bush de demarcar politicamente a América Latina, região que vem estabelecendo, cada vez mais, relações comerciais com a União Européia e que tem na liderança de Hugo Chaves, uma forte oposição às pretensões geopolíticas da Casa Branca.
Os argumentos, no entanto, encobriram, em parte, uma discussão aprofundada do foco fundamental da visita de Bush: a eficácia do etanol como fonte de energia limpa. Embora seja considerado um biocombustível, o álcool etílico possui uma cadeia de produção que envolve a queima da cana-de-açúcar na pré-colheita, processo responsável pela emissão de altos níveis de gás carbônico (CO2) para a atmosfera.
Esse dado não só embasa questionamentos acerca da validade dos investimentos feitos em etanol, mas também levanta debates sobre a forma como a questão energética vem sendo tratada pelos diferentes países. Para comentar essa questão, o Olhar Virtual entrevistou Luiz Fernando Legey, professor do Programa de Planejamento Energético, do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pesquisa e Pós-graduação em Engenharia (Coppe). Veja as contribuições do pesquisador para o assunto.
“É possível achar uma saída para o dilema das fontes de energia, só que acredito estarmos caminhando para o lado errado. Temos que nos concentrar em transformar o tipo de consumo dominante; é cada vez mais comum, por exemplo, vermos carros enormes que transportam apenas uma pessoa. O automóvel é uma das piores coisas que aconteceram em termos de utilização de recursos naturais. A quantidade de recursos que são carreados na construção de um automóvel é absurda; ele encarna bem o espírito individualista de nossos tempos.
Por isso creio que a solução para as fontes de energia exige toda uma mudança, não só no comportamento das pessoas como consumidores, como também na oferta de transporte coletivo que é oferecido a elas. Tem que haver investimentos maciços em transporte de massa. Devemos trabalhar o lado da oferta nesse sentido e não mudando apenas um combustível pelo outro.
Diante disso, acredito que o acordo firmado entre o Brasil e os EUA não muda nada. Ele não tem a menor importância; o memorando serviu muito mais para acalmar os ânimos dentro dos EUA do que para avançar na questão energética. Todos sabem que o Bush está mal junto à população norte-americana; creio que ele fez isso para desviar a atenção das críticas. Geralmente, quando a situação interna do presidente está ruim, adota-se a estratégia de mandá-lo para fora do país para que a mídia volte sua atenção para as viagens. Essa visita do Bush tem muito mais importância para dentro dos EUA do que para o Brasil ou para a questão da energia mundial.”