Olho no Olho

O que é melhor: ter o diploma, a aptidão ou os dois?

Cadu Cayres

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Será que a obrigatoriedade do diploma e toda a regulamentação profissional que ele fornece, garantem aos profissionais de diversas áreas, a liberdade para exercer o seu ofício, sem o risco de verem a precarização das relações de trabalho acontecer diante dos seus olhos? Na coluna “Ponto de Vista”, da revista Veja São Paulo, o economista Cláudio de Moura Castro afirmou que “para certas profissões, faz sentido que a lei exija o diploma, pois protege o consumidor incapaz de checar as aptidões de determinado profissional, já para outras, nem tanto”.

Na visão de algumas pessoas, o que importa não é a exigência do diploma para a prática de qualquer profissão, mas sim a qualificação que um curso de graduação proporciona, pois, seja qual for o trabalho a ser desenvolvido, precisa ter sido antes lapidado, estruturado num embasamento teórico bastante amplo.

Para refletir sobre essa questão, o Olhar Virtual entrevistou Flávio de Marco Filho, professor da Escola Politécnica da UFRJ, e Luiz Antônio Cunha, professor da Faculdade de Educação. Confira abaixo as contribuições dos dois professores para a discussão.

 

Flávio de Marco Filho
professor da Escola Politécnica

"Acho o diploma importantíssimo, entretanto, não é para qualquer um. Afirmo isso baseado no excesso de cursos que estão oferecendo diploma, enquanto o necessário seria um certificado, qualificando o indivíduo no que diz respeito a determinado assunto. Quando me refiro ao “diploma”, visualizo um documento capaz de representar o final de uma vida universitária — presumindo que a bagagem teórica tenha sido de acordo com a oferecida no ensino de superior.

Para mim, em algumas profissões a exigência do diploma é necessária, para outras não. Jamais entraria num consultório se o médico não possuísse diploma. O mesmo digo em relação à engenharia. A meu ver, profissões que necessitam apenas de talento para serem desempenhadas, não precisam desse tipo de legitimação como, por exemplo, música: o cara toca muito bem algum instrumento, sabe ler partitura, compõe etc., apenas vai cursar uma universidade, se quiser; caso contrário, não.

Até na própria engenharia, questiono a oferta de diploma para determinados cursos — gostaria de deixar claro, que, na grande maioria, é impossível ser engenheiro sem ter passado por uma universidade. Alguém jamais chegará a tamanho conhecimento fazendo apenas um cursinho de especialização. Isso é fato.

Em relação ao mercado de trabalho valorizar, por vezes, mais o diploma do que a experiência, acho uma tremenda estupidez. Se algum dia tiver que contratar um profissional, vou primeiramente avaliá-lo por sua competência e aptidão, depois verificarei seu diploma."

Luiz Antônio Cunha
professor da Faculdade de Educação

“Todos os países do mundo têm diplomas que atestam que o possuidor fez determinados cursos e está habilitado a exercer atividades socialmente reconhecidas. Quanto a essa legitimação, nada a criticar. O único problema é que, especialmente no Brasil, há um exagero no uso.

Desde os primórdios da república, havia textos que criticavam essa questão. Segundo eles, a sociedade estava envolvida numa substituição da aristocracia dos títulos nobiliárquicos por uma aristocracia acadêmica. O mais incrível, é que nesses textos, oriundos dos séculos XIX e XX, o caráter profético em relação ao uso do diploma, salta aos olhos. Basta perceber que até hoje, chamamos alguém de doutor sem querer saber se ele cursou, ou não, doutorado. Tal postura reforça a idéia de que nossa sociedade, perdendo as hierarquizações do século XIX, baseadas na aristocracia da nobreza, necessita inventar uma outra forma de hierarquização, e, pelo visto, o diploma foi uma das maneiras encontradas.

A grande expansão do ensino superior — mais o privado do que o público — é a responsável pela perpetuação dessa demanda de hierarquização social. Acredito que ainda estamos nesse impulso que contribui para distinção do cidadão em duas classes, até no ponto de vista policial (quem tem nível superior, vai para prisão especial).

Outro aspecto que gostaria de abordar, são os requisitos profissionais para ocupação dos cargos, ou seja, quais são os níveis de escolaridade necessários para exercer determinado posto. Existe uma boa dependência entre uma coisa e outra, que é reforçada pelo forte elemento de mercado. Essa dependência se intensifica quando o nível de escolaridade fica elevado, aumentando assim as exigências no campo de trabalho para facilitar a seleção, e colocando em segundo plano a competência, a aptidão e a experiência. Isso acaba atingindo profissionais na faixa dos 40 anos, que se vêem ameaçados pelos jovens recém chegados ao mercado de trabalho, cheios de titulações.

Acredito, veementemente, que a competência e aptidão são mais relevantes que o diploma."

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