De Olho na Mídia

Regular para democratizar

 

Júlia de Marins

 

Os atrasos para finalização e divulgação do Plano Nacional de Comunicação, proposto pelo Ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, têm deixado comunicadores e sociedade civil apreensivos quanto ao processo de aprovação do projeto. Apesar de não ter apresentado todas as propostas, o Ministro afirmou que o documento deve atualizar a legislação do setor de Comunicação, criada em 1962 e modificada pela última vez em 1997, com a implementação de medidas que priorizem a democratização da Comunicação.

A elaboração do novo marco regulatório conta ainda com a participação da Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e o Direito à Comunicação com Participação Popular (Frentecom), composta por 190 deputados federais de dez partidos diferentes e apoiada por 100 organizações da sociedade civil, por meio de debates com Bernardo. Entre as principais ideias que poderão integrar as novas regras estão o Plano Nacional da Banda Larga e a proibição de que um mesmo grupo de comunicação seja proprietário de rádio e TV. Entretanto, a demora da definição e os conflitos de interesses surgidos nas discussões sobre o Plano não impedirão que ele seja concretizado? A população tem participação da discussão? O governo federal está exercendo devidamente seu papel? As medidas apresentadas até agora são satisfatórias?

Para Marcos Dantas, professor da Escola de Comunicação (ECO-UFRJ), a legislação vigente é desatualizada e o Brasil precisa do novo marco regulatório para “tratar das realidades e dos fenômenos novos da comunicação, como é o caso da TV digital, da TV por assinatura, do e da internet”. Segundo ele, “precisamos de um marco que considere o mercado da comunicação, já que estamos num país capitalista, mas que o regule do ponto de vista democrático e cidadão”.

De acordo com o professor, o fato de as propostas ainda não terem sido totalmente definidas deve-se, entre outros fatores, às divergências de objetivos expostos em discussões entre diferentes componentes do setor da comunicação. “Cada um tenta puxar os benefícios para o seu lado. Alguns querem uma forte regularização para terem mais espaço na mídia, já outros não querem muitas mudanças para manterem seus modos de atuação”. Além disso, Dantas também ressalta que a ligação de alguns parlamentares com grandes organizações do setor da comunicação “é uma grande dificuldade para que haja um consenso e a aceitação de muitas modificações, mas a mobilização que está sendo feita em prol do Plano Nacional da Comunicação também é forte”.

Como prova disso, o professor aponta que a criação da Frentecom foi uma ótima iniciativa para representar a população e seus interesses democráticos, já que “seria impossível perguntar para todo o povo brasileiro como deve ser o marco, pois as vontades individuais e momentâneas pesariam muito. Por isso, a criação da Frente foi uma ideia fantástica, porque através dela ocorre a contribuição popular mais importante, baseada na participação de representantes de diversos partidos políticos e organizações civis. É a melhor maneira de estabelecer um diálogo com a sociedade”.

Quanto à atitude do governo Dilma, Dantas defende que, ao contrário de Lula, a atual presidenta tem colaborado com a discussão e evolução do assunto. “Por meio do ministro, Dilma está permitindo um diálogo entre uma autoridade e uma frente popular que nunca aconteceu em nosso país. O contato de uma personalidade importante do governo como Bernardo e parte de uma sociedade não comercial, como sindicatos e professores, é algo inédito e louvável”, afirmou o professor.

Marcos Dantas acredita que as possíveis propostas expostas até agora formam um documento coerente que evita a monopolização da informação e a exclusão de uma parte da população do contato com a mídia. “Concordo que é preciso coibir o domínio de grandes organizações sobre veículos de diferentes mídias. Desta maneira, outros segmentos da sociedade também terão voz”, apontou o professor. Ainda de acordo com ele, “a aplicação de medidas como o Plano Nacional da Banda Larga pode ser uma boa iniciativa, mas precisa ser acompanhada de outras melhorias de infraestrutura, principalmente na área da educação. Só assim a população terá todas as condições de usufruir da comunicação de maneira correta, sendo capaz de analisá-la”.