Cenas de violência no Rio de Janeiro

     

Entrevista com o professor Michel Misse

OV: Qual a opinião do senhor sobre a superexposição da violência na cidade do Rio de Janeiro nos programas de ficção? Isso funciona como denúncia de uma realidade vivida por cariocas ou é apenas uma forma de aumentar os números de audiência?

MM: É um pouco as duas coisas, mas o efeito é incontrolável: aumenta a sensação de insegurança, principalmente entre os não-moradores do Rio. A cidade já é vista como violentíssima por quem não conhece o Rio, a ponto de pessoas de fora me dizerem que não vêm ao Rio pois não sabem como evitar todas as violências que imaginam ocorrerão com elas. Elas não sentem a mesma coisa quando vão ao Recife, a Vitória ou mesmo a São Paulo. Ninguém sente medo de ir a Washington. Todas essas cidades têm taxas de assassinatos maiores que o Rio.

OV: Caso seja da vontade do autor de obras de ficção denunciar os problemas da violência na cidade, essa forma de denúncia é válida? Que resultados ela traz?

MM: A violência urbana já está mais do que visível, não é necessário mais denunciá-la, ninguém mais aguenta tanta exposição da violência na mídia. O autor provavelmente quer saborear o realismo da insegurança coletiva, sem precisar criar um novo personagem para matar a moça. Dá-lhe então de bala perdida. O resultado é banal para quem já trata do assunto e aterrorizador para quem não conhece o Rio. Em lugar do serial killer, a bala anônima...

OV: Muitas pessoas dizem que a imagem do Rio de Janeiro é denegrida com a exibição de cenas de violência em programas de ficção, cujo cenário é a própria cidade. Há que defenda que essas obras prejudicam o turismo. Qual é a opinião do senhor sobre esse assunto?

MM: Prejudica o turismo interno, mas não o externo. Os turistas estrangeiros não assistem à tv brasileira com a mesma frequência dos turistas brasileiros de outros estados. A histeria da mídia com a criminalidade urbana no Rio não tem paralelo nem na mídia de outros estados (alguém sabe o nome do maior traficante de São Paulo? Não, mas o Beira-Mar todo mundo conhece), nem na mídia internacional. Isso não quer dizer que o Rio é uma cidade pacífica, mas também não é isso tudo que a imaginação solta de quem não conhece a cidade pode supor sob o impacto do que lhe apresentam na tv. Isso evidentemente faz mal à cidade.