Com a área um pouco maior que a metade de Sergipe (21,9 quilômetros quadrados), o menor estado brasileiro, a Irlanda do Norte abriga um povo dividido por conflitos religiosos que vão além do debate de ideias. Apesar de ingressar no século XXI sublimando por meio de acordos políticos a ira recíproca que já acarretou milhares de mortes tanto do lado católico quanto do protestante, a arte urbana ainda revela nas ruas da capital Belfast que o país vai demorar muito para se dizer unido. Foi o que ficou claro a quem assistiu à palestra da professora Stephanie Schwerter, da École de Hautes Études em Sciences Sociales, de Paris, na última segunda-feira (5/9), na Faculdade de Letras.
Convidada pelo Departamento de Letras Anglo-Germânicas da faculdade, a professora Stephanie buscou contextualizar para o público o período mais violento do confronto civil e explicar a origem histórica de tanto ódio e rancor de ambos os lados. Dos anos finais da década de 1960 até 1998, quando cessam as atividades terroristas, a fase de escalada de violência na Irlanda do Norte, segundo ela, acabou sendo conhecida pelo nome de “The Troubles” (Os Problemas).
De um lado, os católicos que desejam a integridade territorial com a independência do Reino Unido dos seis condados que ficam a nordeste da ilha; do outro, os protestantes que querem que tudo permaneça como está. Chamada de Ulster pelos cidadãos irlandeses de origem britânica, a Irlanda do Norte foi o campo de batalha no qual as duas comunidades trocavam tiros e bombas. Hoje, a animosidade está restrita a manifestações artísticas nas paredes das casas, decoração das lojas ou nas pinturas nacionalistas dos paralelepípedos-limite das calçadas, conforme as imagens apresentadas por Stephanie.
As imagens reforçavam o discurso da professora de que Belfast, a principal cidade e capital da Irlanda do Norte, ainda é um território no qual os bairros são divididos por muros e cercas de arame farpado, onde os moradores ainda tomam medidas cotidianas de proteção como se a qualquer momento a violência voltasse a eclodir. “Belfast é uma cidade diferente de outros lugares, onde os turistas podem seguir uma rota por mapas. Lá, as ruas e estradas são bloqueadas por paredes que dividem as comunidades (católica e protestante) e não estão destacadas nos guias”, contou.
Ao relatar o sentimento que teve ao visitar São Paulo, onde é enorme a quantidade de helicópteros que cruzam os céus carregando empresários e gente apressada, a professora revelou o medo de quem viveu em território conflagrado. “Fazia lembrar o tempo em que as aeronaves britânicas voavam para um lado e para o outro patrulhando a capital norte-irlandesa”, disse ela, que em pouco mais de uma hora fez a plateia refletir, a partir das imagens de Belfast, o quão distante está a paz definitiva entre católicos e protestantes.